segunda-feira, 28 de julho de 2014

Trabalho, ciência, tecnologia e cultura: dimensões da formação humana

O trabalho é conceituado, na sua perspectiva ontológica de transformação da natureza, como realização inerente ao ser humano e como mediação no processo de produção da sua existência. Essa dimensão do trabalho é, assim, o ponto de partida para a produção de conhecimentos e de cultura pelos grupos sociais.
O caráter teleológico da intervenção humana sobre o meio material, isto é, a capacidade de ter consciência de suas necessidades e de projetar meios para satisfazê-las, diferencia o ser humano dos outros animais, uma vez que estes não distinguem a sua atividade vital de si mesmos, enquanto o homem faz da sua atividade vital um objeto de sua vontade e consciência. Os animais podem reproduzir, mas o fazem somente para si mesmos; o homem reproduz toda a natureza, porém de modo transformador, o que tanto lhe atesta quanto lhe confere liberdade e universalidade. Desta forma, produz conhecimentos que, sistematizados sob o crivo social e por um processo histórico, constitui a ciência.
Nesses termos, compreende-se o conhecimento como uma produção do pensamento pela qual se apreende e se representam as relações que constituem e estruturam a realidade.
Apreender e determinar essas relações exige um método, que parte do concreto empírico–forma como a realidade se manifesta – e, mediante uma determinação mais precisa através da análise, chega a relações gerais que são determinantes do fenômeno estudado. A compreensão do real como totalidade exige que se conheçam as partes e as relações entre elas, o que nos leva a constituir seções tematizadas da realidade. Quando essas relações são “arrancadas” de seu contexto originário e ordenadas, tem-se a teoria. A teoria, então, é o real elevado ao plano do pensamento. Sendo assim, qualquer fenômeno que sempre existiu como força natural só se constitui em conhecimento quando o ser humano dela se apropria tornando-a força produtiva para si. Por exemplo, a descarga elétrica, os raios, a eletricidade estática como fenômenos naturais sempre existiram, mas não são conhecimentos enquanto o ser humano não se apropria desses fenômenos conceitualmente, formulando teorias que potencializam o avanço das forças produtivas.
A ciência, portanto, que pode ser conceituada como conjunto de conhecimentos sistematizados, produzidos socialmente ao longo da história, na busca da compreensão e transformação da natureza e da sociedade, se expressa na forma de conceitos representativos das relações de forças determinadas e apreendidas da realidade. O conhecimento de uma seção da realidade concreta ou a realidade concreta tematizada constitui os campos da ciência, que são as disciplinas científicas. Conhecimentos assim produzidos e legitimados socialmente ao longo da história são resultados de um processo empreendido pela humanidade na busca da compreensão e transformação dos fenômenos naturais e sociais. Nesse sentido, a ciência conforma conceitos e métodos cuja objetividade permite a transmissão para diferentes gerações, ao mesmo tempo em que podem ser questionados e superados historicamente, no movimento permanente de construção de novos conhecimentos.
A extensão das capacidades humanas, mediante a apropriação de conhecimentos como força produtiva, sintetiza o conceito de tecnologia aqui expresso. Pode ser conceituada como transformação da ciência em força produtiva ou mediação do conhecimento científico e a produção, marcada desde sua origem pelas relações sociais que a levaram a ser produzida. O desenvolvimento da tecnologia visa à satisfação de necessidades que a humanidade se coloca, o que nos leva a perceber que a tecnologia é uma extensão das capacidades humanas. A partir do nascimento da ciência moderna, pode-se definir a tecnologia, então, como mediação entre conhecimento científico (apreensão e desvelamento do real) e produção (intervenção no real). 
Entende-se cultura como o resultado do esforço coletivo tendo em vista conservar a vida humana e consolidar uma organização produtiva da sociedade, do qual resulta a produção de expressões materiais, símbolos, representações e significados que correspondem a valores éticos e estéticos que orientam as normas de conduta de uma sociedade.
Por essa perspectiva, a cultura deve ser compreendida no seu sentido mais ampliado possível, ou seja, como a articulação entre o conjunto de representações e comportamentos e o processo dinâmico de socialização, constituindo o modo de vida de uma população determinada. 
Uma formação integral, portanto, não somente possibilita o acesso a conhecimentos científicos, mas também promove a reflexão crítica sobre os padrões culturais que se constituem normas de conduta de um grupo social, assim como a apropriação de referências e tendências que se manifestam em tempos e espaços históricos, os quais expressam concepções, problemas, crises e potenciais de uma sociedade, que se vê traduzida e/ou questionada nas suas manifestações.
Assim, evidencia-se a unicidade entre as dimensões científico-tecnológico-cultural, a partir da compreensão do trabalho em seu sentido ontológico.
O princípio da unidade entre pensamento e ação é correlato à busca intencional da convergência entre teoria e prática na ação humana. A relação entre teoria e prática se impõe, assim, não apenas como princípio metodológico inerente ao ato de planejar as ações, mas, fundamentalmente, como princípio epistemológico, isto é, princípio orientador do modo como se compreende a ação humana de conhecer uma determinada realidade e intervir sobre ela no sentido de transformá-la.
A unidade entre pensamento e ação está na base da capacidade humana de produzir sua existência. É na atividade orientada pela mediação entre pensamento e ação que se produzem as mais diversas práticas que compõem a produção de nossa vida material e imaterial: o trabalho, a ciência, a tecnologia e a cultura.
Por essa razão trabalho, ciência, tecnologia e cultura são instituídos como base da proposta e do desenvolvimento curricular no Ensino Médio de modo a inserir o contexto escolar no diálogo permanente com a necessidade de compreensão de que estes campos não se produzem independentemente da sociedade, e possuem a marca da sua condição históricocultural.

(DCNEM/2011 - p. 19 e 20)

Um comentário:

  1. Aluna Myriam Ascholz de Andrade
    Professor Augusto Martins
    A escola foi pensada, me parece para o aluno que é ou venha a ser um ser perfeito. Com todos os valores, atitudes, cumprindo todas as responsabilidades que lhe cabe. Se esta pessoa está na escola para ser um cidadão, primeiro temos que assumir que este terá suas dificuldades em apresentar-se perfeito diante das situações presentes e futuras. A sociedade é corrompida e corruptível. Os alunos convivem com todos os organismos sociais e seus agentes, de forma que não podemos imaginar que não haja contaminação.
    O aluno recebe as informações de uma pessoa, o professor, que o enxerga perfeito; alguém que chega a sala de aula sem sono, sem fome, com as emoções equilibradas, etc. Para este aluno são passadas tarefas, exige-se atenção, foco, coerência de raciocínio; é dado a ele algo impalpável, racional, frio. Tem que se adaptar a estas situações, amadurecer, enquadrar-se nas dimensões e propósitos que a escola tem a oferecer-lhe. Este pode ou não encontrar-se neste ambiente; pode ou não desfrutar positivamente destas possibilidades; pode ou não enfrentar estes desafios do modo esperado pela escola.
    O aluno é um mundo, um imenso mundo que entra no mundo da escola, um mundo maior ainda, repleto de pessoas, ambientes, fontes de informações, tarefas, regras que deve, por força, viver e reconhecer como algo a ser vivido por longos anos a sua frente.
    Como Transmitir informações, promover a elaboração da informação, ensinar o caminho para buscar e aperfeiçoar a tecnologia, a pesquisa, como ensiná-lo a aprender a aprender?
    Como, mantendo a identidade que traz consigo valores e aspirações diferenciadas, provocaremos efeitos positivos nestes jovens?
    Como provocar, instigar, comprometê-los na busca de novos conhecimentos para construir novas tecnologias?
    Como transformá-los em cientistas, buscadores de informações confiáveis? Analíticos críticos, propositores de alternativas sociais tecnológicas que sejam convergentes com sua filosofia de vida?
    A relação entre a velocidade de informações que recebemos todos os dias e a que passamos pela vida dos alunos interfere negativamente sobre as conquistas alcançadas por eles.
    Tanto a transformação da informação em conhecimento, como a convivência ficam minimizadas em importância, profundidade, efetividade.
    Muitas sugestões tornam-se repetitivas como a diminuição de alunos por turma, elevar o tempo de permanência do aluno na escola, equipar melhor os espaços escolares, valorizar os profissionais da educação, etc. Isto é extremamente necessário, mas proponho que vejamos, conheçamos este aluno seus valores e suas mazelas com coragem para aproximarmo-nos dele de forma humanizada, amorosa, imbuída de reconhecer suas igualdades e diferenças.
    Esta aproximação transforma o ambiente não em algo caseiro, mas aconchegante, receptivo, humanizado. O que favorece a resolução das demais problemáticas relativas à educação.
    Quem dirige uma turma deve saber quem são os indivíduos que a compõem, caso contrário será uma fala para quem não se conhece, não se tendo ideia de como poderá ser recebida.

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