segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Refletindo sobre os estudantes e os professores do Ensino Médio Noturno no Colégio Estadual do Paraná

Alexandro Muhlstedt1
Resumo:
O presente texto é o relato de oficina desenvolvida no Progama “Formação em Ação”, a qual se insere como atividade de formação continuada em serviço, sendo, neste caso, de professores que atuam no Ensino Médio noturno no Colégio Estadual do Paraná. Foi desenvolvida em dois encontros, em julho e outurbro de 2014, e foi coordenada por pedagogos. Por meio de levantamento de problemas, discussões e reflexões, buscaram-se alternativas para melhorar o processo de ensino e apredizagem nesse turno da escola. Entendendo, à luz das Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Médio, que o estudante do período noturno é trabalhador, concluiu-se que existe a necessidade de revisão constante de metodologias docentes, estudos e compreensões mais apuradas sobre a realidade e as necessidades desses estudantes.
Palavras-chave: Ensino noturno; Estudante trabalhador, Trabalho docente, Colégio Estadual do Paraná, Formação continuada.

INTRODUÇÃO

Com o objetivo de refletir sobre a questão do Ensino Médio Noturno do Colégio Estadual do Paraná foi realizada, em 28 de julho e 07 de outubro, das 20 às 22h, a oficina denominada: “Os estudantes e professores do Ensino Médio Noturno”. Essa atividade fez parte do programa de formação continuada dos professores “Formação em Ação”, evento da Secretaria de Estado da Educação, prevista no Calendário Escolar, da qual participaram todos os professores e funcionários do Colégio.
Na oficina mencionada, coordenada pelos pedagogos Alexandro Muhlstedt e Simone Baranhuk, realizada na Sala 113, foi possível aprofundar aspectos sobre o Ensino Médio noturno, junto aos professores que atuam neste turno.
A decisão pelo tema partiu das observações realizadas pelos pedagogos ao longo do 1º Semestre, especialmente no momento do 1º Conselho de Classe e nos Plano de Trabalho Docente, nos quais notou-se a necessidade de refletir melhor sobre os sujeitos que atam no período noturno. Esse relato é, então, resultado de observações e análises depreendidas no dia a dia da escola.

1. A metodologia adotada

Os pedagogos optaram por estudo de estudo e reflexão, trabalho em pequenos grupos, registros em forma de painel, apresentação em plenária e debate.


2. A atividade proposta

Para realizar a atividade, os pedagogos responsáveis selecionaram um texto constante nas Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Médio, de 2011, que trata sobre os estudantes do Ensino Médio Noturno. O texto, elemento desencadeador da reflexão, foi estudado e a partir dele, sugerida uma reflexão sobre o estudante do ensino médio noturno. A questão sugerida foi: “Em que medida o Ensino Médio de nossa escola aparece no texto das DCNEM?”
Após a reflexão, papeletas foram distribuídas aos professores para que escrevessem “Quais os problemas vivenciados no noturno do CEP?”. As papeletas foram fixadas no painel, na parede, e o grupo foi elencando situações semelhantes e exemplificando-as. Os problemas citados foram:

  • Falta de interesse em estudar / Desatenção
  • Falta de motivação, de identidade / pertencimento do aluno com o Colégio
  • Carência
  • Indisciplina (atrasos após intervalo / solicitações para ida ao banheiro / uso do celular / alunos exageram nas brincadeiras)
  • Alunos com interesses pré definidos
  • Falta de tempo para estudar / trabalhar de dia
  • Alunos fora da faixa etária
  • Turmas numerosas
  • Carga horária reduzida
  • Violência ao redor do colégio
  • Evasão escolar

Todos os problemas apontados são vivenciados cotidianamente pelos professores. Salientaram que esses problemas são causa e consequência de questões mais amplas, que fogem ao alcance da ação escolar. No entanto, exige-se que ações sejam desenvolvidas para amizar as situações apontadas.
Foi proposto ao grupo um conjunto de reflexões e discussões sobre os problemas apontados, buscando compreendê-los em sua dimensão macro e microssocial.

3. Apontando novas possibilidades

Para encerrar, os participantes do grupo trabalharam em duplas para apontar possíveis soluções. Para isso, sugeriu-se a seguinte questão: “O que fazer para alcançar o inverso dos problemas?”.
Os professores mencionaram o seguinte:

Práticas e metodologias diferenciadas; não permitir o uso de celulares e afins; atuação de profissionais da psicopedagogia.
(Professores Wanda / Biologia e Leonardo / Filosofia)

Condições favoráveis de trabalho como turmas com menor número de alunos, na faixa etária equilibrada; propiciar mais possibilidades de estratégias metodológicas que favoreçam o contato e orientação mais humana aos alunos; EJA mais eficiente para alunos de mais idade.
(Professora Dalnei / Arte)

Currículo diferenciado, aulas / oficina / laboratório integrado com várias disciplinas optativas; metodologia que promova a relação do conteúdo escolar com a história e o munda da vida.
(Professor Carlos Alberto / Arte)

Trabalho de conscientização com alunos indisciplinados ou imaturos para o Ensino Médio Noturno; emprego de novas tecnologias nas aulas – computador, xilofones, teclado, laboratório de Inglês, geografia e demais disciplinas), quadro de giz adequado para aula de Arte; desenvolver atividades avaliativas em sala.
(Professores Eloi / Geografia e Mario Sergio / Inglês)

Proporcionar aos alunos aulas vivenciais; fomentar a procura pelo conhecimento; organização dos conteúdos a cargo do professor e visando uma maior identidade por parte do educador; contar como parte da avaliação cursos e oficinas inerentes a cada matéria.
(Professor Jeronimo / Arte)

Nota-se um conjunto de ideias, sugestões e propostas idealistas, que fazem emergir o “sonho” e as aspirações dos professores por uma escola em que posso concretizar seus desejos de bom ensino. Salientou-se que o trabalho na escola está para além do alcance dos interesses pessoais de cada professor, mas das decisões tomadas pelo coletivo, em consonância com a legislação e as possibilidades pedagógicas da própria mantenedora. Isso não signfica comodismo, mas compreender as questões atrewladas à realidade e viabilidade de implementação.

4. Apresentando Proposta de Atividade

Diante das questões apresentadas pelos professores na primeira parte da Oficina percebeu-se a necessidade de continuidade das reflexões, a fim de estabelecer, coletivamente, novas estratégias e novas ações pedagógicas que considerem as peculiaridades do ensino médio noturno no CEP.
Por isso, em 07 de outubro realizou-se o segundo encontro do “Formação em Ação”, no qual propôs-se estudo e reflexão sobre “Os professores e os estudantes do Ensino Médio Noturno”.
Os pedagogos do noturno Alexandro Muhlstedt, Simone Baranhuk e Ana Lucia de Lara organizaram a seguinte sequência de atividades:

  1. Leitura / Socialização do relatório de julho de 2014.
  2. A partir das sugestões apresentadas pelos professores, apontar estratégias possíveis e viáveis para 2015 que considere a realidade do Ensino Médio Noturno do CEP.
  3. Música: Queremos saber, de Gilberto Gil.
  4. Leitura do texto: O Sentido da Formação Humano Integral.
  5. Compartilhamento de percepções / opiniões.

5. Sistematizando as Discussões

Após a leitura do relatório do encontro de julho, os professores escreveram ações para as possibilidades apontadas:

POSSIBILIDADES ELABORADAS EM JULHO
AÇÕES SUGERIDAS EM NOVEMBRO
Práticas e metodologias diferenciadas;
Não permitir o uso de celulares de afins;
Atuação de profissionais da psicopedagogia.
(Wanda - Biologia e Leonardo - Filosofia)
Propor uma organização diferente da sala de aula similar à organizada em aulas de aprendizado de língua estrangeira, cujas práticas privilegiem a leitura, a escrita, a audição e a oralidade – EM TODAS AS DISCIPLINAS.
Além disso, é necessário contemplar os diversos tipos de aluno, bem como a maneira como estes aprendem, pois o colégio prioriza o aluno auditivo em detrimento das demais formas de aprendizagem.
(Denise – Matemática e Adriano – Língua Portuguesa)
Condições favoráveis de trabalho como turmas com menor número de alunos, na faixa etária equilibrada;
Propiciar mais possibilidades de estratégias metodológicas que favoreçam o contato e orientação mais humana aos alunos;
EJA mais eficiente para alunos de mais idade.
(Professora Dalnei/Arte)
Turmas com 30 alunos

(Professora Dalnei - Arte, Waldemar – Arte, Carlos de Paula - Arte, Beatriz - Estagiária de Pedagogia)
Currículo diferenciado, aulas oficina/laboratório integrado com várias disciplinas optativas;
Metodologias que promovam a relação do conteúdo escolar com a história e o mundo da vida.
(Carlos Alberto - Arte)
Buscar o currículo valorizando as disciplinas e culminando em todos os anos, por áreas exatas ou propedêutico.
Oficinas valerem-se com currículo, carga horária e aproveitamento.
Interdisciplinariedade dos conteúdos escolares com significados para o meio em que o aluno vive.
(Dalnei - Arte, Waldemar – Arte, Carlos de Paula - Arte, Beatriz - Estagiária de Pedagogia)
Trabalho de conscientização com alunos indisciplinados ou imaturos para o Ensino Médio Noturno;
Emprego de novas tecnologias nas aulas – computador, xilofones, teclado.
Laboratório de inglês, geografia e demais disciplinas.
Quadro de giz adequado para aula de Arte.
Desenvolver atividades avaliativas em sala.
(Eloi – Geografia; Mario Sergio - Inglês)
Trabalho de conscientização: Já está acontecendo com reuniões para a conscientização dos pais e alunos.
Trabalho realizado em relação as faltas e a indisciplina. Acreditamos que este trabalho possa ser ampliado para mais discussões.
Novas tecnologias: Busca dos recursos necessários. Cabe a direção, coordenação pedagógica, professores pensarem no coletivo o acesso as novas tecnologias.
(Elói – Geografia, Geraldo - Arte)
Proporcionar aos alunos aulas vivenciais;
Fomentar a procura pelo conhecimento;
Organização dos conteúdos a cargo do professor e visando uma maior identidade por parte do educador;
Contar como parte da avaliação cursos e oficinas inerentes a cada matéria.
(Professor Jeronimo - Arte)
Visitas a museus, exposições, instituições, universidades, cinema, teatro, etc.
Buscar sempre desenvolver os conteúdos a partir da realidade / cotidiano/vivência do estudante, aproximando tais conhecimentos da sua existência e ao mesmo tempo fornecer condições e assim desenvolver a sua própria criticidade.
No Colégio Estadual do Paraná já se fazem na prática avaliações diferenciadas como por exemplo relatórios de aulas práticas, oficinas de arte, treinamento nos esportes, entre outras.
(Wanda Sofia Kusch – Biologia e Wilson José Vieira - Filosofia)

Para complementar a reflexão e fomentar o objetivo central da escola – que é a disseminação de conhecimento historicamente elaborado - foi ouvida a música: “Queremos saber”, de Gilberto Gil, interpretada por Cassia Eller. O objetivo foi a sensibilização e compreensão a partir da música.

Queremos saber o que vão fazer com as novas invenções
Queremos notícia mais séria sobre a descoberta da antimatéria
E suas implicações na emancipação do homem das grandes populações
Homens pobres das cidades, das estepes dos sertões
Queremos saber, quando vamos ter raio laser mais barato
Queremos, de fato, um relato, retrato mais sério do mistério da luz
Luz do disco voador pra iluminação do homem
Tão carente, sofredor, tão perdido na distância da morada do senhor
Queremos saber, queremos viver, confiantes no futuro
Por isso se faz necessário prever qual o itinerário da ilusão
A ilusão do poder pois se foi permitido ao homem tantas coisas conhecer
É melhor que todos saibam o que pode acontecer
Queremos saber, queremos saber, queremos saber, todos queremos sabe

O trabalho em pequenos grupos e as reflexões a partir da música possibilitaram alguns questionamentos ao grupo, como por exemplo: Em que situações o professor “muda”? O grupo manifestou um conjunto de ideias expressando que as mudanças no professor ocorrem: “Quando ele quer”, “Devido as práticas que deram certo”, “Utilizando a própria avaliação como forma de mudança”. Isso levou ao questionamento qsobre quais mudanças devem acontecer, mas sem esvaziamento pedagógico.
Também perguntou-se: “Por que mudar?” e o grupo de professores apontou que implementam-se mudanças: “Quando tem problemas”, “Quando atingem o professor”.
O grupo também trouxe ao debate questões que acabam fazendo com que o professor seja massacrado pela cultura escolar instalada, como as condições objetivas de trabalho, a despolitização do mesmo, a perca do caminho dos sentidos e significados da escola, a entrada em rotinas e a escazzes de tempo para estudos.
Expuseram também que no CEP há tentativas para autonomia do professor, mas que ainda não foi alcançadas como um todo. Entendem que há uma autonomia relativa e um passo importante é ressignificar as relações e os diálogos.

6. Conclusão

Com a realização dessa Oficina foi possível, do ponto de vista dos Pedagogos, elencar algumas questões mencionadas pelos professores eme seus relatos.
O desinteresse ou falta de interesse em estudar por parte dos alunos tem muito a ver com o processo que ocorre na escola que não atende aos interesses dos alunos. Afinal, nem sempre o histórico de vida dos alunos que estudam no período noturno são considerados, tampouco questões como “para que aprender”, “para que estudar”. Assim, torna-se importante questionar qual seria o real sentido da escola. Tanto para os estudantes, quanto para os próprios professores que atuam no período noturno.
Houve relato do período noturno ser reservado para estudantes que reprovam no diurno, cristalizando a ideia de um ensino inferior, de menor qualidade. Seria realmente o aluno do noturno um aluno trabalhador? Pesquisa nas três turmas de 1º série mostrou que, de 56 alunos, 30 possuem alguma atividade profissional durante o dia. E nessas mesmas turmas a maioria tem entre 14 e 15 anos, demonstrando estarem na faixa etária adequada.
Fortalece-se a ideia de que há no noturno uma imagem de “aluno refugo”. Essa imagem de aluno, negativa e derrotista, “forçaria” a uma prática de ensino pelos professores de menor qualidade, até porque não valeria a pena investir na aprendizagem desses alunos sabendo-se que não querem aprender. O professor estaria refém desse perfil de aluno, mesmo lamentando que “bons” alunos acabam “perdendo tempo” e não avançando em sua aprendizagem. Nivela-se por baixo.
A evasão ocorre em função do cansaço daqueles que trabalham e moram longe da escola, até porque o CEP não possui comunidade (está fora do Geo Referenciamento) e quem matricula-se na escola é por escolha, mesmo residindo distante.
A Educação de Jovens e Adultos precisa ser reorganizada pois muitos alunos fora da idade recusam-se a transferir-se para escola mais adequada às suas condições de idade por acharem que aluno de EJA é discriminado quando busca acesso ao trabalho.
Os professores falam da necessidade de melhores condições de trabalho (menos alunos em sala, por exemplo) e diante disso manifestam certo conformismo com as situações atuais à espera de condições ideais. Reflete-se o que pode ser feito considerando o que se tem.
Conclui-se que ainda há muito o que se trilhar nas discussõers e reflexões acerca do ensino no período noturno no Colégio Estadual do Paraná. Momentos como os que foram vivenciados no “Formação em Ação” possibilitam rediscutir e repensar estratégias em em prol dos estudantes que buscam na escola pública educação e formação.

7. Referências Bibliográficas
BRASIL. Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Médio, 2011.
GIL, G. Queremos saber. Interpretação de Cassia Eller. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=hlbt97rJY1A>. Acesso em 06/10/2014.



1 Pedagogo da Rede Estadual do Paraná, atua no Colégio Estadual do Paraná, em Curitiba. Professor participante do PDE e Mestrando em Educação pela UFPR. E-mail: supervisoralex@bol.com.br

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