segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

FICHAMENTO - OS PROFESSORES COMO INTELECTUAIS: rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem – Henry A. Giroux / Capítulo 9: Professores como Intelectuais Transformadores – p. 157 a 163

Alexandro Muhlstedt1

1. Breve biografia do autor

Henry Armand Giroux nasceu em Providence, estado de Rhode Island, EUA, em 18 de setembro de 1943.
É um crítico cultural e um dos teóricos fundadores da pedagogia crítica nos Estados Unidos e bem conhecido por seu trabalho pioneiro no ensino público, estudos culturais, sobre a juventude, o ensino superior, a mídia e a teoria crítica.
Seu trabalho ilustra uma série de tradições teóricas que se estendem desde Marx a Paulo Freire e Zygmunt Bauman. Também é um defensor da democracia radical. Opõe-se ao neoliberalismo, ao militarismo, ao imperialismo, ao fundamentalismo religioso e aos ataques que ocorrem sob o estado neoliberal no salário social, na juventude, nos pobres e na educação pública e superior.
Como crítico, propôs reflexões sobre as teorias educacionais, a escola e o papel e influência dos professores nos processos de ensino aprendizagem.
Giroux considera a pedagogia libertadora como um veículo para a construção da razão crítica, o que permitiria aos cidadãos romper com o padrão, ou seja, se tornarem capazes de tomar uma posição crítica em relação ao domínio existente das pedagogias tradicionais.
Iniciou, de fato, uma nova escola de pensamento e, com a sua voz afirmativa, vibrante e empenhada, instigou à ação tanto os teóricos como os práticos da educação. Ao advogar uma pedagogia da responsabilidade, assumiu a responsabilidade pelo seu próprio papel social e político de acadêmico. Concentrou a sua atenção na redefinição e no reforço da noção de ‘público’ em relação ao conhecimento, à educação e à vida cívica, sobretudo incorporando conceitos tais como ‘tempo e espaço públicos’. Enquanto muitos teóricos da educação se concentraram na influência da sociedade no contexto educativo, Giroux, embora pondo criticamente a nú as forças políticas e econômicas que ameaçam a independência e a criatividade na escola e na academia, é mais ousado e chama, de forma clara, a atenção para o potencial transformador da escola e da academia no contexto mais amplo da sociedade, recuperando, assim, a natureza política da atividade pedagógica. Por fim, embora focalize o seu discurso nos aspectos gerais da educação, na educação para a cidadania e nos estudos culturais, Giroux oferece, através das suas propostas para a teoria e a prática educativas, aos teóricos e práticos da língua e da comunicação intercultural os fundamentos para a renovação das suas visões e das suas práticas.

2. Síntese do Capítulo 9 – Professores como Intelectuais Transformadores

Neste capítulo o autor apresenta que os movimentos de reforma educacional atuais apresentam uma ameaça e um desafio.
Ameaça: “pouca confiança na capacidade dos professores da escola pública de oferecerem uma liderança intelectual e moral aos jovens...” (p. 157). Muitas recomendações ignoram que os professores são responsáveis pela preparação dos alunos para serem cidadãos ativos ou críticos, inclusive ignorando as contribuições dos mesmos nos debates, sua “...inteligência, julgamento e experiência...” (p. 157). Com isso, parece que ao “...examinar criticamente a natureza e processo de reforma educacional” (p. 157) os professores são descartados.
Desafio: união dos professores ao debate público com seus críticos (p. 157) e também “a oportunidade de se engajarem em uma auto crítica muito necessária em relação á natureza e finalidade da preparação dos professores, dos programas de treinamento no trabalho e das formas dominantes de escolarização” (p. 157-8). o debate oferece aos professores a “oportunidade de se organizarem coletivamente para melhorar as condições em que trabalham e demosntrar ao público o papel fundamental que ele devem desempenhar em qualquer tentativa de reformar as escolas públicas” (p. 158).
O autor também menciona que a atual crise pela qual a educação passa tem a ver com o enfraquecimento dos professores em todos os níveis, sendo isso uma precondição teórica para que se organizem e estabeleçam uma voz coletiva no debate atual, bem como a crescente perda de poder em torno das condições de seu trabalho e mudanças na percepção do público quanto a seu papel reflexivo (p. 158).
O autor examina dois problemas que tem a ver com a melhoria da atividade docente:
1 – exame das forças ideológicas e materiais que têm contribuído para a proletarização do trabalho docente – “tendência de reduzir os professores ao status de técnicos especializados dentro da burocracia escolar” (p. 158) o que leva os professores ao cumprimento de tarefas dos programas escolares do que desenvolver ou apropriar-se criticamente de currículos que dêem conta de seus objetivos pedagógicos.
2 – necessidade de defesa da escola como instituição essencial na manutenção e desenvolvimento de democracia crítica e defesa dos professores como intelectuais transformadores – ênfase na “reflexão e prática acadêmica a serviço da educação dos estudantes para que sejam cidadãoes reflexivos e críticos” (p. 158).
2. 1. Desvalorização e desabilitação do trabalho docente

Uma ameaça aos professores é o desenvolvimento de “ideologias instrumentais que enbfatizam uma abordagem tecnocrática para a preparação dos professores e também para a pedagogia da sala de aula” (p. 158).
O autor destaca problemas do tipo sepação da concepção de execução, padronização do conhecimento escolar e desvalorização do trabalho crítico e intelectual pela primazia de considerações práticas, o que confirgira uma racionalidade instruemental (treinamento dos professores com orientação behaviorista nos EUA). Essa questão taz como consequência a negação da própria necessidade de pensamento crítico (p. 159). O autor também critica que futuros professores, nessa visão, acabam se preocupando em aprender “como fazer”, “o que funciona” ou maneiras de ensinar dado conhecimento sem os devidos questionamentos ou discussões (p. 159 – 60). Também reduz a autonomia dos professores de carreira por impor “pacotes curriculares à prova dos professores, que reserva a eles o “simples papel de executar procedimentos de conteúdos e instruções determinados” (p. 160) legitimando a “pedagogia do gerenciamento” (que nada mais é senão a suposição teórica de que o “comportamento dos professores precisa ser controlado” (p. 160) novamente ignorando as peculiaridades de regiões, comunidades e escolas). Essa pedagogia organiza a vida escolar em torno de especialistas em currículo, instrução e avaliação que concebem o ensino, restando aos professores a tarefa de implementação (p. 160).
O autor coloca-se contra tal concepção e prática evidenciando que está em “desacordo com a premissa de que os professores deveriam estar ativamente envolvidos na produção de materiais curriculares adequados aos contextos culturais e sociais em quais ensinam (p. 160) e que há uma suposição errônea de que todos os estudantes podem aprender a partir dos mesmos materiais, técnicas e modos de avaliação (p. 161). Essa suposição descarta aquilo que é peculiar nas didferentes experiências, práticas linguísticas, culturais e talentos dos estudantes.

2.2. Professores como Intelectuais Transformadores
O autor afirma a necessidade de repensar e reestruturar a natureza da atividade docente encarando os professores como intelectuais transformadores. Para isso, na p. 161 apresenta três maneiras pelas quais essa categoria é útil:
1 – oferece base teórica para exame da prática docente contrária aos instrumentalismos ou tecnicismos.
2 – esclarece os tipos de condições ideológicas e práticas necessárias para que os professores funcionem como intelectuais.
3 – ajuda a esclarecer o papel que os professores desempenham na produção e legitimação de interesses políticos, econômicos e sociais através de suas práticas pedagógicas.
Ao entender o professor como intelectual, o autor parte do princípio de que “toda atividade humana envolve alguma forma de pensamento” (p. 161) dignificando a capacidade humana de integrar o pensamento a e a prática e os professores como “homens e mulheres livres, com uma dedicação especial aos valores do intelecto e ao fenômeno da capacidade crítica dos jovens” (p. 161). Também efatiza que os professores devem “assumir responsabiliade ativa pelo levantamento de questões sérias acerca do que ensinam, como devem ensinar e quais são as metas mais amplas pelas quais estão lutando” (p. 161) sendo isso o compromisso pela formação dos propósitos e condições de escolarização.
O autor volta a insistir que o papel de ensino não pode ser reduzido ao simples treinamento de habilidades práticas e que a categoria de professores intelectuais contribui para o desenvolvimento de sociedade livre e democrática, bem como a formação destes como estudiosos e profissionais ativos e reflexivos – papel em termos políticos e normativos (p. 162).
Sobre a função social dos professores enquanto intelectuais o autor assevera que as escolas são “locais econômicos, culturais e sociais que estão inextrincavelmente atrelados à questões de poder e controle” (p. 162) estando muito além de simplesmente repassarr um conjunto comum de valores e conhecimento e sim, sendo lugares que representam formas de conhecimento, práticas de linguagem, relações e valores sociais que são selções e exclusões particulares da cultura mais ampla. Ou seja, as escolas servem para “introduzir e legitar formas particulares de vida social” (p. 162). alega ainda que as escolas são “esferas controversas que incorporam e expressam uma disputa acerca de que formas de autoridade, tipos de conhecimentos, formas de regulação moral e versões do passado e futuro devem ser legitimadas e transmitidas aos estudantes (p. 162). Com isso, configura a escola como espaço que não é neutro e que os professores tampouco o são.
Reforça o autor que os professores como intelectuais “estruturam a natureza do disurso, relações sociais em sala de aula e valores que eeles legitimam em sua atividade de ensino” (p. 162) e somente a partir disso seriam capazes de educar os estudantes para serem cidadãoes ativos e críticos.
Encerra o capítulo explicitando o argumento de que é necessário “tornar o pedagógico mais político e o político mais pedagógico (p. 163).
- Pedagógico mais político – inserir a escolarização diretamente na esfera política, argumentando que as escolas representam tanto um esforço para definir o significado quanto a luta em torno das relações de poder, por meio de reflexãoe ação crítica. Com isso, almeja-se “...uma fé profunda e duradoura na luta para superar injustiças econômicas, políticas e sociais, e humanizarem-se ainda mais como parte desta luta” (p. 163).
- Político mais pedagógico – utilizar formas de pedagogia que incorporem interesses políticos que tenham natureza emancipadora, tratando os estudantes como agentes críticos, tornando o conhecimento problemático, utilizando o diálogo crítico e afirmativo e argumentando em prol de um mundo qualitativamente melhor para todas as pessoas. Nesse sentido, os professores intelectuais transformadores assumem “a necessidade de dar aos estudantes voz ativa em suas experiências de aprendizagem” e desenvolvem uma “linguagem crítica que esteja atenta aos problemas experimentados em nível da experiência cotidiana” (p. 163) especialmente em sala de aula. Para isso, é imperativo o estudo coletivo conectado às peculiaridades, probelmas, esperanças e sonhos dos diversos ambientes culturais, raciais, históricos e de classe e gênero (p. 163).
Por fim, “os intelectuais transformadores precisam desenvolver um discurso que una a linguagem da crítica e alinguagem da possibilidade, de forma que os educadores sociais reconheçam que podem promover mudanças” (p. 163). Nesse sentido, o professor assume um compromisso contra as injustiças econômicas, políticas e sociais dentro e fora da escola e mesmo sendo tarefa difícil é uma “luta que vale a pena travar”, até porque de outro modo, é negar aos professores a chance de consolidarem a sua função enquanto “intelectuais transformadores (p. 163).

3. Alguns comentários
Segundo Giroux (1997) ao assumir a postura de intelectual transformador, o professor torna-se capaz de inovar e mudar. Com isso, a cidadania crítica do aluno seria efetivada, pois o professor agiria com capacidades intelectuais para melhorar a prática pedagógica.
O autor comenta que como resposta à ideologia da prática educacional tradicional, surgiu com todo vigor, nos Estados Unidos e Inglaterra, a pedagogia radical e crítica, preocupada em questionar a dominação social através da escola. Essa pedagogia tenta desvelar como a escola reproduz a lógica do capital, visto que os tradicionalistas se recusaram a questionar a natureza política do ensino, privilegiando o domínio de técnicas pedagógicas e a escola como local de instrução, ignorando as escolas como locais de políticas e culturas, omitindo a relação entre conhecimento, poder e dominação.
Os críticos radicais questionam essa ideologia educacional tradicional, apontando o conhecimento transmitido pela escola como representação particular da cultura dominante, num processo seletivo de exclusões. Nesta visão, as escolas são vistas quase que exclusivamente como agências de reprodução social, produzindo trabalhadores obedientes para o capital.
Apesar de trabalhar com a questão da reprodução das ideologias na escola, Giroux aponta que os críticos radicais recuaram no questionamento que combinasse a linguagem da crítica com a linguagem da possibilidade (re)construindo um discurso que colocasse o professor como o centro das transformações no ensino, assim, oferece bases teóricas para a realização de uma prática docente transformadora. Para esta realização Giroux elenca dois elementos essenciais: a definição das escolas como esferas públicas democráticas e a definição dos professores como intelectuais.
Giroux (1997) comenta que o clima político e ideológico não parece favorável para os professores no momento. As reformas educacionais estão reduzindo os professores ao status de técnicos de alto nível, cumprindo ordens e objetivos decididos por especialistas, afastados da realidade cotidiana da sala de aula. Neste momento surge a oportunidade da união dos professores em torno de um debate que examine as forças ideológicas e materiais que tentam proletarizar a atividade docente. Para repensar esta estrutura, os professores devem assumir a postura de intelectuais transformadores.
Ao encarar os professores como intelectuais, elucida-se a idéia de que toda atividade humana envolve alguma forma de pensamento. E que os mesmos podem contribuir efetivamente para o fomento da capacidade crítica dos alunos. Os professores como intelectuais são necessários neste momento em que segundo Giroux (1997) é necessário tornar o político mais pedagógico e o pedagógico mais político, na tentativa de humanização da vida de todos os cidadãos.
Porém, como aponta Contreras, “o caráter programático da obra de Giroux modstra qual deveria ser a situação dos professores enquanto intelectuais, mas não como os professores que estão presos aos limites de suas salas de aula poderiam chegar a construir semelhante posição crítica em relação à sua profissão” (2012, p. 178). Assim, para efetivação de um programa de formação de professores entendidos como intelectuais transformadores torna-se necessário investigar possibilidades para “as possíveis articulações com as experiências concretas dos docentes” (CONTRERAS, 2012, p. 178).

4. Co-relação com o tema da pesquisa: Formação Continuada e Profissionalidade do Professor
Minha pretensão de pesquisa é compreender os processos de construção da profisisonalidade dos professores do Colégio Estadual do Paraná, nos momentos semanais de formação continuada desenvolvidos nas horas atividades concentradas.
Essa inquietação surge como resultado do movimento de pesquisa que realizei no PDE (Programa de Desenvolvimento Educacional) sobre a prática reflexiva dos professores, no qual acabei me deparando com o conceito do professor como intelectual transformador que abarca a reflexividade como elemento importante de atuação pedagógica e de forma bem mais ampla.
Essa categoria de análise foi revelando-se a mim como um referencial crítico de contribuição para que os professores problematizem os interesses que estão inscritos nas formas institucionais e práticas cotidianas reproduzidas na escola. Fui notando também que os professores como Intelectuais transformadores atuam de tal forma que a reflexão e a prática estão intrinsecamente relacionadas, e como consequência, oferece uma contra-ideologia. Esta é contrária às pedagogias tradicionais que instrumentalizam e administram a separação da concepção de execução, ignoram a especificidade das experiências e as formas subjetivas que moldam o comportamento dos estudantes e professores.
Mesmo sem os aportes teóricos necessários, movido por uma certa intuição e baseado em leituras esparsas que realizei, fui percebendo que alguns professores combinam reflexão e ação no interesse de fortalecerem o seu trabalho como ponto de análise. Fui percebendo também que os estudantes, notadamente do Ensino Médio, desenvolvem habilidades e conhecimentos necessários para abordarem as injustiças e desigualdades e de serem atuantes críticos comprometidos com o desenvolvimento de um mundo mais justo e democrático. E isso, sem movimentos opressivos e de exploração, vão interpretando o mundo criticamente e buscando mudanças, incluindo lutas contra as “pequenas injustiças” no interior da escola.
Algo que sempre chamou minha atenção, de forma positiva, é que certos professores desenvolvem um tipo de trabalho pedagógico no qual oferecem aos estudantes a oportunidade de tornarem-se cidadãos portadores de conhecimento e coragem para lutarem por seus direitos, sem desespero. Por conta dessa intelectualidade e transformação, Giroux (1997) mostrou-me que a questão do papel político dos professores possibilita que sejam "mediadores, legitimadores e produtores de ideias e práticas sociais".
Assim, aos poucos fui consolidando a ideia de que a formação docente, considerando a que ocorre no interior da escola, especialmente na Hora Atividade, poderia ser um momento de realizar a reflexão, a pesquisa e a discussão crítica com vista à transformação social dos estudantes e a construção da profissionalidade balizada em práticas conscientes, coerentes, éticas e responsáveis. Seria isso um tipo de exercício que promove a real vivência da cidadania e da democratização do ensino?
Ancorando-se na ideia de Giroux (1997) sobre professor enquanto Intelectual Transformador, a pesquisa pretendida almeja discutir e propor práticas docentes mais críticas, criativas e democráticas que visam à formação do cidadão crítico e ativo, focada na transformação social, contra os ditames dominantes. Torna-se um grande desafio compreender a escola como campo político, composta pela tensão de poderes, reflexos da sociedade mais ampla, pressupondo, então, a utilização de pedagogias que incluam interesses políticos de essência emancipatória, que lutem pelo desenvolvimento dessa escola como esfera emnentemente pública democrática, tornando “o pedagógico mais político e o político mais pedagógico”.

5. Referências Bibliográficas

CONTRERAS, J. Autonomia de professores. 2. ed. Tradução Sandra Trabuco Valenzuela. São Paulo: Cortez, 2012. 327 p.
GIROUX, H. A. Os professores como intelectuais: rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. 270 p. pp. 157-164.


1 Professor Pedagogo da rede estadual de ensino do Paraná. Atua no Colégio Estadual do Paraná. Mestrando em Educação Pela Universidade Federal do Paraná. E-mail: supervisoralex@bol.com.br

A INFLUÊNCIA DA FORMAÇÃO CONTINUADA EM SERVIÇO NA CONSTITUIÇÃO DOS SABERES DOCENTES: Mapeando expectativas de professores do Colégio Estadual do Paraná

Alexandro Muhlstedt1

RESUMO:

Influenciados pelos movimentos das políticas oficiais pela formação e profissionalização no Brasil, desde 1990, os saberes da prática dos professores têm sido motivo de inúmeras pesquisas na atualidade. O presente trabalho focaliza os saberes docentes como objeto de estudo e propõe uma pesquisa sobre o mapeamento das expectativas de um grupo de 12 professores do Ensino Médio, do Colégio Estadual do Paraná, a respeito do curso de formação continuada denominado “Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Médio”. O curso foi desenvolvido pela UFPR em escola pública do estado do Paraná, em 2014. Trata-se de um análise sobre os saberes dos professores, constituídos na prática escolar, a partir de frequência aos cursos de formação continuada em serviço, considerando os conhecimentos e práticas que veiculam. Com base nos estudos de Maurice Tardif (2012), são analisados os dados da pesquisa, que revelaram o interesse dos professores participantes, bem como suas indagações, anseios, questionamentos e expectativas a partir da frequência ao curso já referido. A análise levou a identificar na condução do curso, as expectativas, novas lógicas, compartilhamento entre os professores, influenciando novas visões e metodologias das áreas que ministram no Ensino Médio, reafirmando objetivos da formação continuada em serviço, na constituição da profissão docente .

Palavras-chave: Formação continuada; Saberes docentes; Expectativas dos professores; Pacto do Ensino Médio.

INTRODUÇÃO

Uma das maiores contribuições do movimento pela profissionalização do ensino escolar, que se inicia na década de 1980, foi o reconhecimento da existência de saberes específicos que caracterizam a profissão docente, saberes desenvolvidos pelos professores tanto no seu processo de formação para o trabalho, quanto no próprio cotidiano de suas atividades como docentes. A partir desse reconhecimento, diversos estudos têm sido desenvolvidos tendo os saberes docentes como objeto, ocasionando um crescimento e uma diversificação cada vez maior no que diz respeito a esse campo de pesquisa.
A respeito do desenvolvimento do interesse de pesquisas sobre os saberes docentes no Brasil, pode-se dizer que as primeiras investigações datam dos anos noventa e foram fortemente influenciadas pelos estudos internacionais norte americanos, desenvolvidos desde o início da década de 1980. Essa influência torna-se evidente principalmente se tomarmos como base a forte tendência das pesquisas brasileiras, em defesa da centralidade da figura do professor. Por outro lado, a busca da importância da compreensão sobre as práticas pedagógicas, a partir de toda complexidade que a envolve, tanto no que diz respeito aos conhecimentos recebidos na formação, à própria atividade de ensinar, como decorrentes de suas experiências como pessoas com histórias, memórias, trajetórias, expectativas e experiências singulares (NUNES, 2001).
Considerando a contribuição e a influência dos estudos internacionais no desenvolvimento das pesquisas brasileiras, torna-se fundamental o contato com a produção de autores e de grupos de pesquisa que têm como objetivo principal investigar a profissão docente e seus saberes.
Neste sentido, ancorado nos estudos de um dos autores, Maurice Tardif (2012), o presente trabalho propõe-se a desvelar alguns elementos que compõem os saberes docentes e mapear as expectativas de um grupo de 12 professores que atuam no Ensino Médio do Colégio Estadual do Paraná (CEP), em Curitiba, a respeito da frequência ao curso de formação continuada em serviço realizado neste mesmo estabelecimento pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), em 2014. Considerando os limites dessa investigação, espera-se contribuir para o debate sobre as especificidades necessárias às atividades dos cursos de formação continuada em serviço, que incorrem sobre os saberes docentes, elaborados e re-elaborados nas práticas que desenvolvem em sala de aula.

1. Saberes docentes: formação inicial e influências diversas

Maurice Tardif é filósofo e sociólogo de formação, professor e pesquisador canadense, da Universidade Laval, em Quebec, e da Universidade de Montreal, onde leciona sobre a história do pensamento pedagógico. Suas pesquisas são voltadas para evolução e a situação da profissão docente, além da formação de professores e os conhecimentos de base da docência. Conhecido internacionalmente, dirige o mais importante centro de pesquisa canadense sobre a profissão docente, o CRIFPE - Centre de Recherche Interuniversitaire sur la Formation et la Profession Enseignante.
É conhecedor e admirador da obra de Paulo Freire, enaltecendo-a no que tange à valorização do papel do professor como agente de mudanças e como intelectual engajado. Especialmente em sua obra intitulada Saberes Docentes e Formação Profissional, Tardif (2012) discorre a respeito dos saberes docentes e sua relação com a formação profissional dos professores e ainda com o próprio exercício da docência.
Destaca, a partir de pesquisas realizadas com o propósito de compreender o que pensam os professores sobre os seus saberes, que o saber docente é um “saber plural, formado de diversos saberes provenientes das instituições de formação, da formação profissional, dos currículos e da prática cotidiana” (p.54). Partindo da ideia de pluralidade, o autor discute que a possibilidade de uma classificação coerente dos saberes docentes, só existe quando associada à natureza diversa de suas origens, às diferentes fontes de sua aquisição e as relações que os professores estabelecem entre os seus saberes e com os seus saberes.
Primeiramente, Tardif (2012) destacou a existência de quatro tipos diferentes de saberes implicados na atividade docente: os saberes da formação profissional (das ciências da educação e da ideologia pedagógica); os saberes disciplinares; os saberes curriculares e, por fim, os saberes experienciais. No quadro a seguir, demonstra-se um a classificação dos saberes e as definições de cada um, segundo o autor:

QUADRO 1 – Classificação dos saberes docentes
SABERES
CONCEITUAÇÃO
Saberes da Formação Profissional
Conjunto de saberes que, baseados nas ciências e na erudição, são transmitidos aos professores durante o processo de formação inicial e/ou continuada. Também se constituem o conjunto dos saberes da formação profissional, os conhecimentos pedagógicos relacionados às técnicas e métodos de ensino (saber-fazer), legitimados cientificamente e igualmente transmitidos aos professores ao longo do seu processo de formação.
Saberes Disciplinares
São os saberes reconhecidos e identificados como pertencentes aos diferentes campos do conhecimento (linguagem, ciências exatas, ciências humanas, ciências biológicas, etc.). Esses saberes, produzidos e acumulados pela sociedade ao longo da história da humanidade, são administrados pela comunidade científica e o acesso a eles deve ser possibilitado por meio das instituições educacionais.
Saberes Curriculares
São conhecimentos relacionados à forma como as instituições educacionais fazem a gestão dos conhecimentos socialmente produzidos e que devem ser transmitidos aos estudantes (saberes disciplinares). Apresentam-se, concretamente, sob a forma de programas escolares (objetivos, conteúdos, métodos) que os professores devem aprender e aplicar.
Saberes Experienciais
São os saberes que resultam do próprio exercício da atividade profissional dos professores. Esses saberes são produzidos pelos docentes por meio da vivência de situações específicas relacionadas ao espaço da escola e às relações estabelecidas com alunos e colegas de profissão. Nesse sentido, “incorporam-se à experiência individual e coletiva sob a forma de habitus e de habilidades, de saber-fazer e de saber ser” (p. 38).
Fonte: Sintetizado a partir de Tardif (2012, p. 36 a 40)

Mesmo reconhecendo e desenvolvendo sua argumentação no sentido de afirmar que há diversos saberes relacionados ao saber fazer dos professores, Tardif chama a atenção para os saberes experienciais em relação aos demais saberes docentes. Esse destaque, se justifica principalmente pela relação de exterioridade que os professores mantêm com os demais saberes, pois não controlam sua produção e sua circulação.

A relação que os professores mantêm com os saberes é a de “transmissores”, de “portadores” ou de “objetos” de saber, mas não de produtores de um saber ou de saberes que poderiam impor como instância de legitimação social de sua formação e como espaço de evrdade de sua prática. Noutras palavras, a função docente se define em relação aos saberes, mas parece incapaz de definir um saber produzido ou controlado pelos que a exercem. (TARDIF, 2012, p. 40).

A relação de exterioridade mantida pelos professores em relação aos saberes curriculares, disciplinares e da formação pedagógica faz com que valorizem ainda mais os seus saberes experienciais, visto que é sobre eles que os professores mantém o controle, tanto no que diz respeito à sua produção quanto à sua legitimação.
No exercício cotidiano de sua função os professores vivem situações concretas a partir das quais se fazem necessárias o desenvolvimento de certas qualificações como habilidade, capacidade de interpretação e improvisação, assim como segurança para decidir qual a melhor estratégia diante do evento apresentado. Cada situação não é exatamente igual à outra, mas guardam entre si certa proximidade que permitem ao professor, então, transformar algumas das suas estratégias de sucesso, em alternativas prévias para a solução de episódios semelhantes, no sentido de desenvolver um habitus específico em sua profissão.
Sendo assim, por mais que o autor especifique que os saberes docentes podem ser provenientes do conhecimento a respeito das ciências da educação e de métodos e técnicas pedagógicas (saberes da formação profissional), do domínio do conhecimento específico a ser ensinado (saberes disciplinares), da apropriação de uma forma “escolar” de tratar os conhecimentos que serão objeto de ensino (saberes curriculares) ou da própria vivência diária da tarefa de ensinar (saberes experienciais), ao mesmo tempo reconhece que existe um saber específico que é o resultado da junção de todos eles e que se fundamenta e se legitima no fazer cotidiano da profissão.
O saber profissional dos professores é, portanto, na interpretação de Tardif, um amálgama de diferentes saberes, provenientes de fontes diversas, que são construídos, relacionados e mobilizados pelos professores, de acordo com as exigências de sua atividade profissional. Essa é a justificativa apresentada pelo autor, para que se considerem inúteis as tentativas no sentido de conceber uma classificação para os saberes docentes, de acordo com critérios que considerem isoladamente a sua origem, seu uso ou ainda as suas condições de apropriação e construção.
Há que se ponderar, segundo a lógica do autor, todos esses critérios em conjunto, e problematizar principalmente as relações existentes entre eles para, somente dessa forma, produzir um modelo válido de compreensão e análise para os saberes dos professores. As fontes de aquisição dos saberes, bem como os modos de sua integração no trabalho dos professores, constituem um modelo que o autor sistematizou no seguinte quadro:

QUADRO 2: Classificação dos saberes docentes considerando as especificidades de sua origem, aquisição e incorporação à prática profissional dos professores

SABERES DOS PROFESSORES
FONTES SOCIAIS DE AQUISIÇÃO
MODOS DE INTEGRAÇÃO NO TRABALHO DOCENTES
Saberes pessoais dos professores
A família, o ambiente de vida, a educação no sentido lato, etc.
Pela história de vida e pela socialização primária
Saberes provenientes da formação escolar anterior
A escola primária e secundária, os estudos pré-secundários não especializados, etc.
Pela formação e pela socialização pré-profissionais
Saberes provenientes da formação profissional para o magistério
Os estabelecimentos de formação de professores, os estágios, os cursos de reciclagem, etc.
Pela formação e pela socialização profissionais nas instituições de formação de professores.
Saberes provenientes dos programas e livros didáticos usados no trabalho
A utilização das “ferramentas” dos professores: programas, livros didáticos, cadernos de exercícios, fichas, etc.
Pela utilização das “ferramentas” de trabalho, sua adaptação às tarefas.
Saberes provenientes de sua própria experiência na profissão, na sala de aula e na escola
A prática do ofício na escola e na sala de aula, a experiência dos pares, etc.
Pela prática do trabalho e pela socialização profissional.
Fonte: Tardif ( 2012, p. 63)

Observa-se que o autor procurou contemplar todos aqueles saberes que julga serem efetivamente utilizados pelos professores na sua atividade profissional e que, por sua vez, interferem diretamente na configuração das suas formas de fazer ou práticas. Há referência aos saberes que seriam caracterizados por contribuírem na formulação das concepções dos docentes a respeito de sua atividade profissional, como, por exemplo, os saberes da formação profissional, os saberes da experiência e os seus saberes pessoais. Tardif (2012) faz referência ainda àqueles saberes que poderiam ser caracterizados como instrumentais (meios concretos de realização) como por exemplo os saberes referentes ao manuseio de ferramentas concretas de trabalho (livros, apostilas, fichas, programas de computador, etc.).
Em relação ao lugar de aquisição dos saberes profissionais dos professores, o autor se preocupa em evidenciar que o processo de constituição do profissional docente, não se restringe ao tempo presente. Isso significa aceitar que as fontes de aquisição dos saberes dos professores se referem igualmente também às experiências do passado e que conhecimentos adquiridos no contexto da sua vida pessoal e familiar, assim como em toda a sua trajetória escolar, são decisivos na constituição de sua identidade profissional, o que justifica portanto, uma característica temporal dos saberes dos professores.
Outro aspecto importante a ser considerado, a partir o quadro construído por Tardif (2012) (Quadro 2) é que o modo de integração dos saberes à prática profissional dos docentes, grande parte das vezes, acontece por processos de socialização. Seja pelas experiências de socialização pré-profissional (que antecedem o ingresso do professor na carreira) ou de socialização profissional (que se referem à trajetória profissional do professor), os saberes docentes não são saberes caracterizados unicamente por uma construção individual.
Por mais que se considere que o professor age sozinho, as relações que estabeleceu, ao longo de sua vida, na sua família, na escola e em outros espaços de convivência social, bem como a interação estabelecida com alunos, colegas de profissão e também nas instituições de formação, interferem nas decisões que toma sobre suas ações. Os saberes profissionais, para Tardif, têm portanto, origens diversas e só podem ser compreendidos se considerados em todos os seus aspectos.
Assim, surge a ideia de perguntar a um grupo de professores que atuam no Ensino Médio de escola pública – o Colégio Estadual do Paraná – sobre as expectativas em relação a um curso de formação continuada.

2. A formação continuada em serviço dos professores

No seu processo de formação, o professor se prepara para dar conta do conjunto de atividades pressupostas ao seu campo profissional. Atualmente, concebe-se essa formação voltada para o desenvolvimento de uma ação educativa capaz de preparar seus alunos para a compreensão e transformação positiva e crítica da sociedade em que vive.
Gimeno Sacristán (1998) considera que a formação de educadores tem se constituído em “uma das pedras angulares imprescindíveis a qualquer intento de renovação do sistema educativo”, o que nos ajuda a entender a importância que esta temática vem adquirindo nas últimas décadas, em meio aos estudos que almejam a melhoria nos processos de ensino. Nos processos de reformas educativas a formação docentes é, então, colocada como elemento central.
Ainda é Gimeno Sacristán (1998) que posiciona essa perspectiva como “reflexão na prática para reconstrução social” (p. 373) concebendo o ensino, como atividade crítica e prática social que se traduz em princípios de procedimentos que dirigem e se desenvolvem ao longo de todo o processo de ensino e aprendizagem. Para tanto, há que se compreender a formação inicial e continuada a partir da confluência entre a pessoa do professor, seus saberes e seu trabalho.
O exercício da docência não pode se resumir à aplicação de modelos previamente estabelecidos, ele deve dar conta da complexidade que se manifesta no contexto da prática concreta desenvolvida pelos professores, o que leva a entender o professor como um profissional que toma as decisões que sustentam os encaminhamentos de suas ações.
Nesse sentido, os saberes específicos da docência, que oferecem apoio ao trabalho dos professores, resultam da estreita articulação entre formação, profissão e as condições materiais em que estas se realizam. Essa articulação valoriza o professor como sujeito que, diante das transformações sociais, procura estabelecer relações e compreensões sobre as novas necessidades dos estudantes, modificando suas práticas continuamente na escola. Sugere, também, uma associação radical entre formação, condições de trabalho, salário, jornada, gestão e currículo, pressupondo uma política de valorização e de desenvolvimento pessoal e profissional.
Nesse conjunto de elementos imprescindíveis para a prática docente, encontra-se a necessidade da formação continuada, entendida como formas de desenvolvimento profissional do professor. Maria Isabel de Almeida (2005), professora da Faculdade de Educação da USP em cursos de Graduação e Pós-Graduação, apresenta um breve mapeamento da variedade das modalidades de formação continuada, possíveis aos professores, e que podem ser conferidas no quadro síntese a seguir:

QUADRO 3: Locais onde se processa a formação continuada de professores
A) A formação continuada realizada na escola
Os professores produzem respostas aos problemas presentes no processo de ensino-aprendizagem e também se desenvolvem nos momentos de convivência, por meio de estudos e trocas. Isso significa que a formação continuada desenvolvida no interior da escola, se constitui num movimento colaborativo, que precisa ser sustentado por um projeto formulado claramente por todos os envolvidos e ser orientado pelo gosto por aprender, cultivado carinhosamente no trabalho escolar, o que vale para professores e alunos.
B) A formação continuada realizada pela universidade
Como explicita a LDB, cabe às universidades formar em quantidade e com qualidade os professores para todos os níveis da educação do país. Coerentes com esse pressuposto, elas têm oferecido inúmeras oportunidades de formação continuada aos professores, seja na relação direta com as escolas, ou por meio de convênios com os sistemas de ensino. Esta é uma dimensão importante da atuação das universidades, não só de formar os professores para o ingresso no magistério, como também de oferecer acompanhamento às suas ações e dar continuidade à sua formação em serviço.
C) A formação continuada realizada no modelo de Educação à Distância
Dentre as inúmeras modalidades de formação continuada, as oferecidas no formato de educação à distância, vêm crescendo muito no país. Logicamente elas ganham cada vez mais espaço em face da enorme demanda dos educadores brasileiros por formação. Elas se baseiam em suportes de comunicação como a Internet, os vídeos ou a televisão e sustentam-se, em grande parte, na articulação entre atividades a distância, como as videoconferências, e as atividades presenciais, apoiadas no uso de apostilas ou de textos. Muitas ações de formação continuada à distância são voltadas para a melhoria da qualidade do ensino e o aperfeiçoamento docente e preocupam-se com a interatividade entre formadores e formandos.
D) A formação continuada realizada por museus e centros culturais
Se é verdade que no trabalho educativo, além de ensinar os conhecimentos fundamentais aos alunos, precisa-se também ensinar a cultura em que se está inserido, fica evidente que o professor precisa preocupar-se igualmente com a sua base cultural. Se não possuir uma boa formação cultural, não se tem condições de ensinar cultura aos alunos. É fundamental que o professor tenha um contato frequente com o mundo da cultura, de forma intensa e diferenciada, lendo livros de literatura, frequentando museus, cinemas, teatros, concertos e shows, de modo a alargar os conceitos e referenciais da docência. Nesse sentido, os museus e centros culturais se constituem em espaços privilegiados de formação continuada.
E) A formação continuada realizada por ONGs, sindicatos ou outros organismos sociais
A importância que a formação continuada vem adquirindo para a melhoria da atuação dos professores tem permitido a participação de novos parceiros em ações de formação, como é o caso das ONGs, dos sindicatos de professores e de outros tipos de organizações existentes, como as associações dos profissionais de áreas específicas do conhecimento, as instituições de pesquisa, as fundações etc. Muitas dessas organizações têm se preocupado em trazer para seus espaços de reflexão e atuação questões relativas à dimensão pedagógica, aos múltiplos aspectos da cultura e aos objetivos e fins da educação.
Fonte: Adaptado de Almeida (2005, p. 13 a 15)

Em cada tipo de formação constatada, conta muito o ambiente escolar onde o professor realiza a sua formação, bem como importa significativamente o profissional que coordena a atividade, pois não se trata apenas de cumprir metas ou somar pontos para avanços na carreira, mas, sobretudo, a contribuição dos cursos para a formação e desenvolvimento profissional docente.
À luz dos estudos que vem sendo desenvolvidos por Tardif (2012) é na confluência da escolha profissional dos professores, quanto optam por um determinado tipo de curso de formação em sua trajetória pessoal, que vai sendo constituído o seu desenvolvimento profissional. Afinal, as experiências pedagógicas na escola vão constituindo um tipo de saber da prática que é “[...] um saber temporal, evolutivo e dinâmico que se transforma e se constrói no âmbito de uma carreira, de uma história de vida profissional, e implica uma socialização e uma aprendizagem da profissão” (p. 110-111).
No caso desse trabalho, a pesquisa com o grupo de professores do Ensino Médio dirigiu-se à formação continuada realizada no interior da própria escola, com apoio da Universidade, evidenciando o importante papel da decisão pessoal, em prol da coletividade e do desenvolvimento profissional.
2. Processo Metodológico: delineando o problema pesquisado

Ancorados nos estudos de Tardif (2012) sobre os saberes docentes, especificamente sobre a constituição dos saberes da prática, solicitou-se a um grupo de 12 professores de diferentes disciplinas, que atuam no Ensino Médio do Colégio Estadual do Paraná, que verbalizassem sobre o que esperam de um curso de formação continuada. Esse curso tem sido realizado na própria escola, com acompanhamento da Universidade Federal do Paraná – O Pograma do Governo Federal: Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Médio -, e tem foco nos estudos sobre o Ensino Médio.
Este curso tem por objetivo principal refletir sobre o currículo do Ensino Médio, visando o desenvolvimento de práticas educativas efetivas, com foco na formação humana integral. Está em consonância com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio e Diretrizes Curriculares da Educação Básica.

2.1. O grupo selecionado – situando o contexto da pesquisa

Como já se mencionou, o grupo de professores selecionados e que atuam no Ensino Médio do já referido colégio estadual, se inscreveu para participar do curso “Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Médio”. Esse curso2 integra um programa do Ministério da Educação, do Governo Federal, e tem como objetivos principais, promover a formação continuada dos professores e coordenadores pedagógicos que atuam no Ensino Médio.
Puderam participar todos os professores da rede pública estadual do Ensino Médio, o quais, uma vez cadastrados no Educacenso como professores do Ensino Médio, e em efetivo exercício da docência, recebem mensalmente, uma bolsa de estudo de R$ 200,00 (duzentos reais).
O curso é constituído por 200 horas, sendo a 1ª Etapa de 100 horas realizada em 2014. Os professores tem 50 horas de atividade coeltiva e presencial e outras 50 horas de estudos individuais. O material utilizado é composto por seis cadernos que abordam os seguintes temas: Sujeitos do Ensino Médio; Ensino Médio; Currículo; Organização e Gestão do Trabalho Pedagógico; Avaliação e Áreas de Conhecimento e Integração Curricular.
No Colégio Estadual do Paraná foram organizadas três turmas e os encontros ocorrem, quinzenalmente, aos sábados, das 8h às 12h. O curso iniciou-se no mês de julho. Para dinamizar o trabalho e sistematizar as discussões os Orientadores de Estudos, profissionais que coordenam os encontros presenciais, criaram blogs, nos quais as atividades vão sendo postadas pelos professores.
Cada um dos Cadernos é constituído por quatro Temáticas as quais apresentam uma atividade denominada “Reflexão e Ação” que deve ser realizada pelos professores, de modo invidual ou em grupo e, em seguida, devem ser postadas nos blogs.
A proposta foi de mapear as expectativas e confrontar as “falas” dos professores, tomando como base as categorias definidas por Tardif (2012), buscando identificar os processos que constituem os saberes dos professores pesquisados, considerando a participação do curso.
Para a pesquisa, foi formulada uma questão a um grupo de 12 professores, sobre suas expectativas em relação ao curso ofertado. Para sistematizar, solicitou-se que respondessem a questão como comentário no Blog (www.docentescep.blogspot.com). A pergunta feita foi: “Qual é a sua expectativa em relação a este curso de formação continuada ofertado, levando em conta as influências nas práticas desenvolvidas na escola?”.
Esse questionamento foi realizado tendo por objetivo constatar o que os professores esperam de um curso de formação continuada, buscando compreender motivações e razões pelas quais se dispõem a estudar em sua profissão e, também partindo do princípio de que se preocupam e se interessam pela sua formação e desenvolvimento profissional.


2.2. Análise das opiniões e concepções sobre formação continuada verablizadas pelos professores
Constata-se, pelas respostas do grupo de professores, que as expectativas são positivas, repletas de interesses pessoais, mas que também trazem à tona necessidades de aspectos da formação, propondo um trabalho de forma coletiva. Os saberes que buscam no curso, em especial, é uma espécie de re-elaboração e reflexão sobre as próprias práticas, demonstrando a necessidade da permanente aprendizagem docente. Percebe-se também que buscam, de modo coletivo, agregar novos saberes e novos valores ao seu trabalho pedagógico junto aos estudantes. Destaca-se a centralidade a formação docente, como espinha dorsal das compreensões necessárias ao trabalho pedagógico com os jovens na faixa etária do Ensino Médio, que se tornaram foco de análise nos cursos de formação de professores.
A partir das respostas dadas pelos professores referentes às suas expectativas em relação ao curso de formação continuada na escola, foi possível sistematizar as verbalizações em alguns temas e recomendações de novos possibilidades formativas, constatados pelos professores.
Percebeu-se que os professores demonstram consciência da necessidade de aperfeiçoamento e atualização permanentes, realizando com isso o própria desenvolvimento profissional, a ser relacionado com o desenvolvimento dos demais colegas de profissão, como se verifica nos depoimentos dos professores indicados a seguir:

"Conhecer para mudar" é um instigante tema para a transformação e a remodelação do Ensino Médio, para que melhores métodos possam nortear nossos trabalhos, para atingirmos o objetivo principal que ora iniciamos com esses estudos: a universalização e a integração humana aos estudantes do Ensino Médio.
(Professora de Língua Portuguesa e Literatura)

A impressão que tenho é que todos estão motivados sobre o curso. Minhas expectativas são as seguintes: aprender um pouco mais sobre a realidade do ensino médio brasileiro; melhorar meu desempenho e minha prática em sala de aula e melhorar meu relacionamento com os alunos (as).
(Professor de Geografia)

Logo na primeira atividade do curso, eu me senti motivado para continuar participando: o levantamento feito com os alunos através do questionário aplicado em várias turmas diferentes de Ensino Médio vai direto naquilo que eu acredito: é necessário conhecer antes de querer mudar algo. As diferenças entre alunos do mesmo estabelecimento mas de turnos diferentes (manhã e noite, por exemplo) são imensas. Imagine então as diferentes realidades que esta pesquisa inicial levantou no Brasil inteiro? Com esses dados, é possível pensar um ensino médio de maneira mais clara e sabendo exatamente onde queremos chegar. Outro aspecto muito positivo é o entrosamento entre os cursistas, que levam todos os assuntos propostos pelo orientador a discussões extremamente proveitosas sobre o tema em questão.
(Professor de Biologia)


Outro aspecto a destacar refere-se ao desenvolvimento de uma reflexão acerca de suas práticas pedagógicas, no sentido da renovação e necessidade da mudança, considerando-a um dos aspectos importantes da atividade docente, pois permite analisar os objetivos atingidos sobre os conteúdos das suas disciplinas, sobre a utilidade dos conhecimentos e sobre os valores que são repassados em sala de aula:

Tenho um grande interesse em cursos na área da educação, pois são oportunidades únicas para realizar uma troca de experiências com outros professores e continuar aprendendo. Fiz minha inscrição para o Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Médio com o objetivo de aprender mais sobre o tema EDUCAÇÃO e melhorar o meu desempenho em sala de aula. A ideia de fortalecer e melhorar o Ensino Médio é importante e acredito que deveria ser ampliada para todas as esferas do ensino. Todos os níveis e áreas de ensino precisam melhorar, pois não é só o Ensino Médio que apresenta problemas.
(Professor de Geografia)


Os professores pesquisados participam de atividades de formação continuada (presenciais e à distância) que nem sempre agregam conhecimentos ou contribuem para a elaboração e re-elaboração de seus saberes da prática, e por isso demonstram um certo ceticismo, uma certa desconfiança inicial.

É interessante o quanto é importante relacionar nossas inquietudes diante do processo. Bem inicialmente não tinha visualizado desta forma, mas no decorrer do processo, das leituras, dos contatos com colegas e estudantes analisados nas pesquisas senti que isto realmente é essencial. Ao estudar o primeiro tópico, reiterou-se o entendimento da fragilidade vivida atualmente. Esta percepção torna-se nítida ao considerarmos a história apresentada cronologicamente e o descaso das políticas públicas desde então. Como também, as discrepâncias sociais e suas consequências no desenvolvimento da juventude do país. Diante dessas reflexões, minhas expectativas em relação ao curso são positivas, porque complementam a minha prática auxiliando-me nas percepções das minhas relações com esta juventude, e as maneiras que ao entender este jovem eu poderei ajudá-lo, assim como no processo de suas aprendizagens.
(Pedagoga)


Acredito ser muito importante nos voltarmos para as questões que envolvem a estrutura, o funcionamento e a concepção que suportam o Ensino Médio. Em nossas reflexões podemos nos abrir a visões de mundo mais complexas, conseguindo integrar novos conhecimentos que possam ser reveladores para a Educação como um todo. Penso que questionar o Ensino Médio é também questionar o Ensino Fundamental e, por que não, a própria universidade. Quando conseguirmos pensar em ciclos e em suas continuidades, não de maneira estanque, será provável estarmos indo de encontro a uma visão mais integral do Ser Humano.
(Professora de Arte)

Na realidade, confesso que o curso me surpreendeu, pois já nos primeiros encontros pude observar que todos que ali se encontravam estavam com um propósito sério de realmente estudar, discutir, refletir e desta forma melhorar o Ensino Médio em nosso país. Desta forma cada vez mais me sinto motivada com o curso e principalmente com a nossa turma.
(Professora de Arte)


Esses professores possuem uma bagagem intelectual que é a base e a referência do seu trabalho, pois não se trata de professores iniciantes, mas sim de um grupo que já possui uma bagagem experiencial de sala de aula. - Valorizam os saberes pedagógicos, apresentando postura de estudo, pesquisa e interesse em melhorar esses saberes, pois acreditam que a construção e incorporação desses mesmos saberes são importantes para melhorar a própria prática docente.- Destacam a importância dos saberes da experiência incorporados à prática profissional, no desempenho das suas funções como professores de escola pública, evidenciando segurança nos saberes construídos pelos anos de sala de aula.

Quando fiz minha matrícula no curso pensava direto na certificação, nos pontos possíveis para avanço na carreira. A bolsa auxílio era um breve atrativo, visto seu pouco valor. Porém, os pensamentos, a coragem de exposição, as discussões, vem tornado nossos encontros cada vez mais interessantes. Minhas expectativas vem aumentado conforme progredimos nos capítulos. Textos interessantes e a boa forma de condução melhoram o processo. Estou realmente feliz em perceber que minhas manhãs de sábados , mais o tempo dedicados aos afazeres do curso, não estão sendo em vão. Estou adorando ver o empenho e a participação dos colegas, principalmente o respeito quando há posições e pensamentos diferentes. Acho que cursos assim realmente adicionam mais a área educacional, principalmente porque faz o próprio professor refletir em suas ações.
(Professora de Química)


Os professores também estabelecem com os alunos um relacionamento com base no respeito mútuo, consideração, confiança e autoridade, demonstrando interesse para que atinjam os objetivos da aprendizagem.

Todos nós professores sabemos que o Ensino Médio precisa mudar, então minha expectativa é que nós, com a ajuda deste Pacto, consigamos enxergar os problemas com mais clareza, e que acima de tudo possamos buscar soluções para os problemas que tanto nos causam angústia e que por muito tempo estávamos esperando por mudanças, acredito que agora chegou este momento
(Pedagogo)

Minha expectativa para este curso é de conseguir compreender os nossos jovens estudantes de hoje, buscar e atualizar nossas metodologias de ensino, evoluir juntamente com aa mudanças que ocorrem com os jovens. Quero estar preparado para as mudanças que estão por vir. Com a ajuda de nossos colegas professores, pedagogos e os materiais oferecidos pelo Ministério da Educação acredito que estaremos nos fortalecendo para melhorar a educação do nosso país.
(Professor de Física)
Estou muito motivado para o curso, apesar do pouco tempo que tenho para fazer as lições de casa. Como disse no primeiro encontro, é a primeira vez que estou dando aulas para o Ensino Médio em turma regular, pois já dei para o Educação de Jovens e Adultos e Cursos Técnicos. Estou gostando muito, pois eles tem mais autonomia e tudo que passo de conteúdo, a grande maioria dos alunos estão topando. Tenho acesso as turmas pela internet, tirando dúvidas, passando trabalhos etc e tal. E com o curso, irei aprender e trocar experiências com professores que já trabalham algum tempo com o ensino médio, além de conhecer um pouco da realidade do Colégio Estadual do Paraná e do Ensino Médio no Brasil.
(Professor de Educação Física)


Também valorizam o uso de ferramentas das novas tecnologias da informação e da comunicação, especialmente por uma adesão tranquila à ideia de realizar as atividades escritas no Blog proposto, e relatam que recorrem à necessidade de terem seus esforços reconhecidos com a contagem de horas para avanços na carreira e pagamento da bolsa auxílio, o que torna uma espécie de atrativo para realizarem o curso de formação.

Nestes encontros iniciais posso assegurar que as discussões têm sido bastante interessantes (mesmo que eu prefira ficar só ouvindo, durante boa parte do tempo). Conhecer melhor como funciona o Ensino Médio no Brasil foi algo que, além de me surpreender em alguns pontos, torna evidente a necessidade de se repensar muito daquilo que consideramos correto. Não posso negar que, depois de uma semana toda de trabalho, a dificuldade para acordar cedo no sábado e ir para o curso é enorme, mas tenho ciência que isso se faz necessário, seja por aquilo que almejo no que diz respeito à progressão de carreira ou, agora de maneira muito mais substancial, pela compreensão de que nós, professores, somos fundamentais para a construção de um E.M. que contribua, ao máximo, para a formação integral dos estudantes, um dos passos importantes para a redução das desigualdades em nosso país. Espero que nossos futuros encontros continuem nos propiciando esse entendimento e a busca da solução dos problemas que enfrentamos.
(Professor de Física)


Essas breves sínteses, corroboram as questões apontadas anteriormente sobre os saberes docentes, constituídos na prática pedagógica que, de certa forma, constituem um

[...] saber existencial, pois está ligado não somente à experiência do trabalho, mas também à história de vida do professor, ao que ele foi e ao que é, o que significa que está incorporando à própria vivência do professor, à sua identidade, ao seu agir, às suas maneiras de ser (TARDIF, 2012, p. 110).

Como muito bem pontuou Nóvoa (1995), o professor, ao aprender ou reaprender o como ensinar, reflete sobre seu “[...] modo próprio de organizar as aulas, de se movimentar na sala, de se dirigir aos alunos, de utilizar meios pedagógicos, um modo que constitui uma espécie de segunda pele profisisonal.” (p. 16 - grifo do autor). A formação continuada, como mecanismo de reflexão, de estudos e de socialização entre os professores, constitui, então, um movimento de importante evolução epistemológica e relacional, uma vez que coloca os professores em postura de crítica ao seu próprio trabalho e fomenta novas práticas à luz de estudos, leituras e debates.
Por isso, ao considerar as expectativas dos professores em relação ao curso de formação continuada, tornou-se possível a tentativa de uma breve síntese em relação ao proposto pelo curso do Pacto do Ensino Médio. Tal síntese apresenta-se nas seguintes categorias:

QUADRO 4: Categorias que sintetizam o proposto pelo curso de formação continuada “Pacto do Ensino Médio”
Local do curso
Centrado no ambiente da própria escola – Colégio Estadual do Paraná.
Apoio de instâncias locais – Direção, Equipe Pedagógica e Coordenadores de Disciplina.
Fomentado pelo Ministério da Educação e desenvolvido pela UFPR.
Organização
Momentos de reuniões quinzenais dos professores, coordenados por um Orientador de Estudos.
Utilização do Laboratório de Informática como ambiente de estudo e registro das ativiadades coletivas.
Espaços para realização de atividades individuais com os estudantes.
Saberes de referência
Organização do Ensino Médio e Diretrizes Curriculares Nacionais.
Necessidades da escola e dos estudantes do Ensino Médio.
Pesquisas elaboradas e desenvolvidas com os estudantes.
Priorização no desenvolvimento do profissional e da pessoa.
Metodologia
Encontros com toda a equipe escolar para evidências diagnósticas.
Planejamento colaborativo das ações pedagógicas.
Estudos, reflexões e postagem de atividades no Blog.
Avaliação para a tomada de decisão.
Trabalhos individuais e em grupos de professores.
Expectativas
Garantir condições de trabalho e desenvolvimento profissional individual e coletivo.
Valorização dos saberes docentes.
Sentido da autonomia crítico intelectual.
Resultados esperados
Desenvolvimento profissional.
Melhorias nas relações pedagógicas na escola.
Compreensões mais apuradas sobre Currículo, Conhecimento, Metodologias e Avaliação no Ensino Médio.
Definição de estratégias inovadoras nas áreas do conhecimento curricular.
Fonte: Adaptado de Fusari; Franco (2005, p. 21-22)

Com isso, percebe-se a necessidade de associar a elaboração e re-elaboração dos saberes docentes à luz dos processos formativos que se aproximam das necessidades dos professores, e que possibilitem melhorias nas sua práticas pedagógicas, considerando as expectativas em relação ao que está proposto pelo curso, como experiências de formação.

3. Considerações Finais

A partir dos resultados e análises apresentadas por Tardif (2012) pode-se afirmar que o processo que torna um professor o que ele é, e o que permite a aquisição e a construção dos saberes necessários à sua prática profissional tem uma complexa configuração, marcada por diferentes períodos, vivências e experiências.
Pode-se afirmar ainda, com base na obra de Tardif (2012), que os cursos de formação inicial não são as únicas fontes de saber dos professores. A prática profissional de um docente, é resultado da relação existente entre os seus diferentes saberes, adquiridos não somente na sua preparação profissional, cursada em instituições destinadas à formação de professores. Os saberes dos professores são, da mesma forma, resultantes dos conhecimentos e ensinamentos aprendidos na sua vida familiar e social, no decorrer de sua trajetória escolar como aluno, no seu próprio lugar de trabalho, por meio das relações estabelecidas com alunos e colegas de profissão.
A partir das perspectivas consideradas, os professores são produzidos pelo seu trabalho, mas também o produzem. Produzem conhecimentos, saberes, práticas, normas de conduta, formas de ser e de fazer. Dão sentido às experiências advindas do exercício de sua profissão e à convivência com os outros que fazem parte do seu cotidiano de trabalho. A formação continuada em serviço, constitui espaços em que se evidenciam os processos de socialização, ancorados em práticas de reflexão e dialógicidade entre os professores.
Para ser coerente, é preciso não desconsiderar as perspectivas teóricas que abordam o ensino “pelo alto”, mas complementá-las com perspectivas que analisem a escola, os professores e seu trabalho “por baixo”, ou por “dentro da escola”, ou seja, a partir da aproximação entre o pesquisador e a escola, o pesquisador e os professores, que são, de fato, os atores dos processos de ensino e que atuam diariamente nas salas de aula de todo o mundo (TARDIF, 2012). Considerar as expectativas e os saberes dos professores que são oriundos de sua prática torna-se também uma forma legítima de valorizar o professor, seu trabalho e suas experiências em sala de aula.
Esta visão a respeito da constituição da profissão docente, é fundamental para que se possa traçar novos referenciais para as pesquisas sobre este tema. É uma visão que exige uma abordagem metodológica que vai além da análise da estrutura dos sistemas de ensino, das instituições e normas que regem o trabalho dos professores, dos agentes externos que interferem na sua prática, dos fatores sociais e globais que muitas vezes determinam os saberes e fazeres docentes .
4. Referências Bibliográficas

ALMEIDA, M. I. Formação contínua de professores em face das múltiplas possibilidades e dos inúmeros parceiros existentes hoje: Múltiplas possibilidades e inúmeros parceiros. In: Formação contínua de professores. Ministério da Educação: Brasília, p. 11 a-17, 2005.

BORGES, C. M. F. Saberes docentes: diferentes tipologias e classificações de um campo de pesquisa. Educação e Sociedade - Dossiê: Os saberes dos docentes e sua formação. Campinas, SP: Cedes, nº 74, Ano XXII, p. 27-42, 2001.

BRASIL. Portaria nº 1.140, de 22 de novembro de 2013 que Institui o Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Médio e define suas diretrizes gerais, forma, condições e critérios para a concessão de bolsas de estudo e pesquisa no âmbito do ensino médio público, nas redes estaduais e distrital de educação. Diário Oficial: Brasília, 9 dez, p. 24 e 25, 2013. (Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&id=20189&Itemid=811. Acesso em 08/dez/2014).

FUSARI, J. C.; FRANCO, A. P. A formação contínua como um dos elementos organizadores do projeto político-pedagógico da escola - Formação contínua em serviço e projeto pedagógico: uma articulação necessária. In: Formação contínua de professores. Ministério da Educação: Brasília, p. 18 - 23, 2005.

GIMENO SACRISTÁN, J. A função e formação do professor/a no ensino para a compreensão: diferentes perspectivas. In: GIMENO SACRISTÁN, J.; PÉREZ GÓMEZ, A. I. Compreender e transformar o ensino. Trad. Ernani F. da Fonseca Rosa. 4 ed. Porto Alegre: Artmed, p. 353 – 379, 1998.

NÓVOA, A. Os professores e as históriaas da sua vida. In: NÓVOA, A. (coord.). Vidas de professores. 2 ed. Porto: Porto Editora, p. 11 – 30, 1995.

NUNES, C. M. F. O professor e os saberes docentes: algumas possibilidades de análise das pesquisas. In: XV ENDIPE – Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino - Convergências e tensões no campo da formação e do trabalho docente: políticas e práticas educacionais, Livro 4. Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2010.

______. Saberes docentes e formação de professores: um breve panorama da pesquisa brasileira. Educação e Sociedade - Dossiê: Os saberes dos docentes e sua formação. Campinas, SP: Cedes, nº 74, Ano XXII, p. 27-42, 2001.

TARDIF, M.. Saberes docentes e formação profissional. 14 ed. Trad. Francisco Pereira. Petrópolis: Vozes, 2012.

1 Professor Pedagogo da rede estadual de ensino do Paraná. Atua no Colégio Estadual do Paraná. Mestrando em Educação Pela Universidade Federal do Paraná. E-mail: supervisoralex@bol.com.br


2 Curso de formação continuada de professores regulamentado pela Portaria Ministerial Nº 1.140, de 22 de novembro de 2013, o qual previu a inscrição espontânea dos professores do Ensino Médio que constavam no Censo Escolar de 2013 - Educacenso.