Alexandro
Muhlstedt1
RESUMO:
Este trabalho traz uma breve reflexão a respeito da concepção da
educação integral, evidenciando a questão do trabalho do
professor. Trata-se de revisão bibliográfica respaldada em textos
de Anísio Teixeira, no Relatório estadunidense sobre como as
pessoas aprendem e nas Orientações proposta pela professora
Veronica Branco. Realizado em 2014, este texto traz a figura do
professor como elemento chave para as elaborações de uma nova
escola e para novas práticas pedagógicas que coloquem os processos
de ensinar e aprender como centralidade do trabalho escolar.
Defendendo o argumento de Anisio Teixeira de que a escola brasileira
não precisa de reforma, mas sim de uma nova escola, o texto conclui
que há muito o que se fazer em prol de uma educação
verdadeiramente integral, destancando que a formação do professor e
sua maneira de entender e praticar o ensino precisa ser
ressignificada para a garantia da efetiva aprendizagem. Com isso,
emerge a necessidade de potencializar um espaços de formação do
professor que facilite a apropriação e o comprometimento deste com
a prática da educação integral.
Palavras-chave:
Educação
integral; Trabalho do professor; Escola; Anisio Teixeira;
Aprendizagem.
INTRODUÇÃO
Pensar
a concepção de Educação Integral é, inevitavelmente, refletir e
questionar as práticas
pedagógicas centrada no modelo tradicional de pedagogia desenvolvida
na maioria das escolas brasileiras, que tem se mostrado ineficaz ao
processo de aprendizagem (tanto dos estudantes quanto dos professores
em ensinar). Essa pedagogia que centra-se em um modelo de ensino
verbalizador e repetitivo, ignora processos importante de
aprendizagem e desenvolvimento dos estudantes. Contra essas práticas
e posturas, o modelo de educação integral apresenta-se como forma
de aproximar a vida e a escolarização, ressignificando, portanto, a
prática educativa.
Anisio Teixeira2,
grande educador brasileiro do século XX, denunciou e trabalhou
exaustivamente em prol de uma educação escolar que não fosse
privilégio para poucos, mas um direito de todos. Ele tratou a
educação como um direito social e instrumento de democratização,
projetando um ensino de qualidade e sendo exigente com um tipo de
pesquisa qualificada e comprometida com os problemas sociais, com a
organização de homens e instituições a serviço da reinvenção
da ciência, da cultura e da política, da própria sociedade
brasileira.
Com isso, traz,
ainda hoje, questionamentos que provocam e instigam a saída dos
professores de uma postura de conformismo e comodismo. Atualizando
esses postulados de Anisio Teixeira, é possível aproximar seus
posicionamentos aos estudos contemporâneos sobre como as pessoas
aprendem os quais explicam a necessidade de mudança e de um agir
individual e coletivo por parte dos professor em prol de
aprendizagens que ressignificam o lugar do ser humano no mundo.
Ressalta-se que
novas estratégias, novas metodologias, novos modos de pensar e
perceber os professores e estudantes na escola, não ocorrem por
decreto ou milagre, mas por um movimento que engloba estudos,
esforço, dedicação, dálogo e reflexão.
Ante a isso, esse
breve estudo ancora-se em uma
revisão bibliográfica respaldada em textos de Anísio Teixeira, no
Relatório estadunidense sobre como as pessoas aprendem e nas
Orientações da professora Veronica Branco, para defender um tipo de
formação de professores que entendem os estudantes em sua
integralidade. Eis um princípio forte que sustenta a Educação
Integral: a aspiração de formar homens capazes de compreender e de
intervir no mundo em que vivem, promovendo o bem comum e a
convivência solidária.
1.
Contextualizando o conceito da Educação Integral
Percebe-se que a
prática pedagógica desenvolvida na maioria das escolas, centrada
num modelo de pedagogia que pode ser chamado de tradicional, tem se
mostrado ineficaz ao processo de aprendizagem. O que ocorre nesse
modelo é que se estabelece uma dissociação entre a vida e a
escola. Com isso, o resultado é uma formação que desconsidera as
necessidades dos estudantes e, consequentemente, é incoerente com as
exigências da contemporaneidade.
Diante disso,
nota-se também que tem havido algumas ações governamentais no
sentido de adotar um modelo de educação integral como forma de
aproximar a vida e a escolarização, re-significando, portanto, a
prática educativa. Uma dessas ações é o Programa Mais Educação.
Ações como essa, de acordo com Moll (2012) buscam fortalecer a
prática pedagógica coletiva, promovendo a co-responsabilização
entre escola, família, setores sociais e comunidade local sobre o
ato de educar.
Pode-se dizer que
quando se idealiza e concretiza uma escola que possua um projeto de
educação integral em sua perspectiva está-se realizando o sonho
adiado de Anísio Teixeira e depois de Darcy Ribeiro (MOLL, 2012).
Projeto este que não se pauta apenas em ampliar o tempo e os espaços
educacionais, mas também partir da ideia de que os estudantes são
sujeitos portadores de diferentes experiências sociais e assim sendo
“fruto de processos igualmente diferenciados” (BRASIL, 2009,
p.15). Nesse sentido, e contexto, propõe-se pensar uma educação
intercultural, onde as identidades culturais possam encontrar espaço
para reconhecerem-se, identificarem-se e transformarem o meio escolar
em uma fonte enriquecedora de trocas entre diferentes grupos, e não
em um espaço de exclusão e preconceito.
O conceito de
educação integral, assim como muitos outros conceitos, carrega
conteúdo histórico e programático, sendo que desde os primórdios,
a noção de educação integral vem impregnada da aspiração de
formar homens capazes de compreender e de intervir no mundo em que
vivem, promovendo o bem comum e a convivência solidária.
Larroyo
(1974), na sua obra História
geral da pedagogia,
aponta que os princípios políticos e filosóficos do conceito de
educação integral se inscrevem no espírito humanista do século
XIX e início do século XX, de crença no progresso, na regeneração
humana e no racionalismo científico, e concebem o homem como um “ser
total”, preconizando uma educação que integre suas múltiplas
dimensões (intelectual, afetiva, física e moral).
As primeiras
experiências foram concebidas por Paul Robin, na França, e, na
Espanha, por Francesc Ferrer – o criador da Escola Moderna em 1901
–, e utilizavam nas atividades cotidianas jogos e múltiplas
atividades artísticas como música, dança, escultura, pintura e
literatura.
No mesmo período,
intelectuais da Escola Nova como John Dewey (1859-1952) enfatizaram a
ideia de que educação é vida e não preparação para a vida. As
experiências educacionais da Escola Nova desenvolvidas em várias
partes do mundo, durante todo o século XX, tinham algumas das
características básicas que poderiam ser consideradas
constituidoras de uma concepção de escola de educação integral.
As próprias denominações assumidas por estas escolas já indicam
muitos de seus objetivos.
Na
obra de Luzuriaga (1990), História
da educação e da pedagogia,
contata-se que entre elas, podem ser citadas as “escolas de vida
completa” inglesas; os “lares de educação no campo” e as
“comunidades escolares livres” na Alemanha; a “escola
universitária” nos Estados Unidos; as “casas das crianças”
orientadas por Montessori, na Itália; a “casa dos pequenos”,
criada por Claparède e Bovet em Genebra; a “escola para a vida”,
criada por Decroly em Bruxelas, Freinet, na França e muitas outras
mais. Considerando suas particularidades, cada uma dessas
experiências dava grande importância à integração entre a
educação intelectual e a atividade criadora para a formação
global da criança.
Em suas mais
variadas expressões enfatizaram a vida social-comunitária da escola
e a autonomia de alunos e professores como princípios formadores de
consciência e atitude diante da vida.
No Brasil, o legado
de Anísio Teixeira (1930 - 1984) pode contribuir significativamente
para o repensar da prática pedagógica e dos espaços educativos.
Para além dos sonhos que ainda hoje são horizontes desejados pela
educação, esse pensador da educação, militante pelo direito e
pela qualificação da educação pública, mobilizou e continua a
inspirar iniciativas de planejamento e operacionalização de
políticas públicas em prol de aprendizagens significativas, de uma
educação integral, em tempo integral e que preze pela qualidade e
efetividade da prática pedagógica ao alcance de todos.
Esse grande
intelectual e pensador brasileiro fez um séria opção por
princípios e valores humanos que podem ser percebidos nos seus
discursos e nas suas práticas político-pedagógicas durante mais da
metade do século XX.
2. Compreendendo
o legado de Anisio Teixeira para a Educação Brasileira
Realçar a
contribuição de Anísio Teixeira para a educação brasileira é,
de certa forma, prestar uma homenagem não apenas a este grande
educador e intelectual, que pagou um alto preço pela defesa concreta
e intransigente de que a educação não é privilégio. Denunciou
com veemência a escola brasileira qu considerava “[...] a educação
um preparao de alguns indivíduos para uma vida mais fácil e, em
rigor, privilegiada” (1957, p. 23).
Durante sua vida
inteira, Anísio Teixeira defendeu a educação do ângulo que mais a
dignifica: o do direito social e da democratização de um ensino de
qualidade, o da pesquisa qualificada e comprometida com os problemas
sociais, o da organização de homens e instituições a serviço da
reinvenção da ciência, da cultura e da política, da própria
sociedade brasileira.
Anísio
Teixeixa foi um dos signatários do Manifesto dos Pioneiros da
Educação Nova3
(1932), que divulgava as diretrizes de um programa de reconstrução
educacional para o país.
O que torna a
trajetória de Anísio Teixeira admirável é a persistência na
defesa da democracia e da educação para a democracia, que
constituiu o motivo central de devotamento da sua vida. Essa defesa
não é apenas apaixonada. É polida por uma filosofia da educação
e uma compreensão aguda da história da sociedade brasileira. Ao
defender o movimento da escola nova, chama a escola para atualizar e
modernizar seus métodos. Anísio Teixeira (1968) argumenta que a
chamada teoria da educação nova “[…] é a tentativa de orientar
a escola no sentido do movimento, já acentuado na sociedade, de
revisão dos velhos conceitos psicológicos e sociais que ainda há
pouco predominavam” (p. 20).
Ele fez parte de uma
geração de intelectuais cuja preocupação maior, na primeira
metade do século XX, foi organizar a nação e forjar o povo através
de uma cultura que procurava assegurar a sua unidade pela instrução
pública, pela reforma do ensino e pela construção de um campo
cultural a partir da universidade. Essa preocupação levou-o, como
outros educadores que lhe foram contemporâneos, a uma relação
contraditória com o Estado.
A leitura de John
Dewey, iniciada durante a década de 1920, proporcionou a Anísio
Teixeira a possibilidade de construir um novo significado
existencial, de encontrar resposta programática para as questões
educacionais com as quais estava lidando e de elaborar uma síntese
para uma nova visão de mundo. Sua apropriação de Dewey foi longa e
múltipla e se desdobra em inúmeras publicações, traduções e na
sua própria prática política. As suas experiências como docente
e, sobretudo, como administrador, em diferentes conjunturas, foram
depurando a sua escolha de temas e a sua apreciação sobre a obra
deste autor. Se Dewey lhe permitiu notável abertura para o mundo
moderno, configurou-se também como o seu grande limite.
O que Anísio
Teixeira defende em tudo o que escreveu é a educação como um
direito de todos. Esse direito tem a ver com a educação de
crianças, adolescentes e adultos almejando a formação dos
intelectuais. Afinal, Anísio Teixeira concebeu a escola como um
espaço real no qual a criança do povo pudesse praticar uma vida
melhor: livros, revistas, estudo, recreação, saúde, professores
bem preparados, ciência, arte, clareza de percepção e crítica,
tenacidade de propósitos.
A obra de Anísio
Teixeira é resultado da eleição da educação como foco de
trabalho. Sua motivação em torno desse foco torna-se um campo de
significado justamente pela sua persistência. Assim, afirmar a
contemporaneidade de Anísio Teixeira é partilhar com ele a
convicção de que muito se falou de educação e muito pouco se
realizou, o que dá a impressão penosa de que se está sempre a se
repetir.
3. Revisitando as
práticas escolares e pensando a Escola em Tempo Integral
Para pensar a
educação hoje há uma exigência de analisar determinados processos
e contextos sociais, culturais, econômicos e políticos de outros
tempos, para assim compreender de que forma se deu a instauração da
institucionalização da Escola. Para tanto, cabe retomar, de forma
breve, as condições que possibilitaram, na Modernidade a emergência
da escola, vista como uma instituição disciplinar, reguladora, com
a finalidade de produzir uma nova sociedade.
No século XVIII,
com o fim da Idade Média, têm-se a passagem de uma sociedade
baseada no sistema de produção feudal para uma sociedade definida a
partir do modelo de produção capitalista. Atrelado a isto surge uma
nova concepção de sujeito – não mais aquele homem frágil e
submisso à vontade Divina – mas sim, como explicado por Silva
(2009) um sujeito que está no centro da ação social, sendo sua
consciência o centro de suas próprias ações, guiado por sua razão
e racionalidade.
O Estado,
representado pela burguesia, transformou-se gradualmente no regulador
e controlador da educação, fundamentando-a de acordo com a
sociedade industrializada que emergia no início do século XIX. A
instituição escolar apresenta-se como uma instituição que
transforma os sujeitos para esta nova realidade, uma vez que se
tornou um espaço (fechado) para que crianças e jovens fossem
enclausurados e retidos, com o objetivo de serem governados e
domesticados. Como esclarece Bauman (2001), este modelo de Escola foi
colocado a serviço de uma Modernidade que deveria tornar a sociedade
o mais previsível e segura possível.
Atualmente, no
século XXI, a impressão vigente que se tem sobre a instituição
escolar é que esta parece estar em desencaixe com a sociedade atual.
O descompasso torna-se visível quando se fala nos alunos que
frequentam os espaços escolares e os conteúdos curriculares que não
interessam aos mesmos, pois, muitas vezes, não se relacionam com seu
cotidiano.
O
que se nota é que a escola vem sofrendo alguns deslocamentos quanto
seu significado e função perante a sociedade atual. Se em outros
tempos a escola foi entendida como um espaço para de
transferência da cultura da humanidade para as novas gerações,
aprendizagem de um ofício e lugar de saber, atualmente, nota-se o
deslocando da sua centralidade do conhecimento escolar para a
problematização das relações pessoais, culturais, sociais,
históricas.
Isto
posto, pode-se dizer que escola de
tempo integral compreende a ampliação da jornada como um fator
demandado pela própria natureza e função da escola. Em outras
palavras, se a função da escola é a de apresentar, constituir e
construir os conhecimentos sócio-historicamente consolidados, então
quanto maior for o tempo dedicado a esse processo, maiores serão as
possibilidades de que essa construção aconteça com qualidade.
A ampliação da
jornada escolar se dá por meio de atividades que acontecem no
contraturno e que, como tal, podem ou não estar vinculadas ao
projeto pedagógico da instituição. Neste caso, as atividades
enriquecem, muito provavelmente, o universo sociocultural do aluno,
mas não necessariamente se constituem como Educação Integral, no
sentido da articulação de conhecimentos e de saberes que fazem
parte da constituição mesma do ser humano, que o vinculam ao
processo humanizador para o qual a escola precisa lhe abrir a porta.
A Educação
Integral apresenta-se, então, como possibilidade de realização de
atividades, em geral no contraturno, que procurariam melhorar a
autoestima do aluno, seu senso de pertencimento a uma comunidade, sua
participação social, além de também ser entendida como uma
"estratégia fundamental para melhorar a qualidade da escola"
(SILVA, 2011).
4.
O trabalho do professor na perspectiva da Educação Integral
A Lei de Diretrizes
e Bases da Educação (LDB), Lei 9394/96, estabelece critérios para
a formação profissional e à valorização profissional em seus
artigo 62 e 67, respectivamente:
Art. 62. A formação
de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível
superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em
universidades e institutos superiores de educação, admitida, como
formação mínima para o exercício do magistério na educação
infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a
oferecida em nível médio, na modalidade Normal.
[...]
Art. 67. Os sistemas
de ensino promoverão a valorização dos profissionais da educação,
assegurando-lhes, inclusive nos termos dos estatutos e dos planos de
carreira do magistério público:
I - ingresso
exclusivamente por concurso público de provas e títulos;
II - aperfeiçoamento
profissional continuado, inclusive com licenciamento periódico
remunerado para esse fim;
III - piso salarial
profissional;
IV - progressão
funcional baseada na titulação ou habilitação, e na avaliação
do desempenho;
V - período
reservado a estudos, planejamento e avaliação, incluído na carga
de trabalho;
VI - condições
adequadas de trabalho.
Parágrafo único. A
experiência docente é pré-requisito para o exercício profissional
de quaisquer outras funções de magistério, nos termos das normas
de cada sistema de ensino. (BRASIL, 1996, art. 62 e 67).
Reafirma-se a
importância da formação profissional numa ação formadora, já
que os profissionais não são apenas dos saberes científicos e
práticos associados aos conteúdos a serem ensinados, mas
educadores, profissionais da ética, do conhecimento, da cultura, do
desenvolvimento e da formação humana. Neste sentido, é importante
muito mais do que aprender técnicas e conteúdos, aprender a
desenvolver a “humana docência”, como sugere Arroyo (2011,
p.50), na busca da formação plena do educando.
Neste sentido, o
professor não exerce apenas a função docente. Ao sair da escola
depois de mais um dia de trabalho, carrega consigo as angústias,
dúvidas, os sonhos e ideais. Não é possível separar a postura
profissional da postura pessoal. “Carregamos a função que
exercemos, que somos e a imagem de professor(a) que internalizamos.
Carregamos a lenta aprendizagem de nosso ofício de educadores,
aprendido em múltiplos espaços e tempos, em múltiplas vivências”
(ARROYO, 2011, p. 124).
Na “humana
docência”, os conteúdos a serem ensinados, vão sendo alargados.
As matérias a serem ensinadas são planejadas e desenvolvidas,
buscando instigar a curiosidade, a paixão de aprender, a emoção e
a vontade de conhecer.
O fundamental é que
professor e alunos saibam que a postura deles, do professor e dos
alunos, é dialógica, aberta, curiosa, indagadora e não apassivada,
enquanto fala ou enquanto ouve. A relação professor-aluno será
sempre mediada pelo conhecimento. Nesse sentido, a atitude do
professor deve ser curiosa, instigadora, desafiadora, criando
condições para a produção ou construção do conhecimento diante
de uma relação sedutora na forma de apresentar a informação, na
qual suas atitudes diante do conhecimento são capazes de influenciar
direta ou indiretamente o comportamento intelectual dos alunos.
Nessa relação de
troca, haverá sempre a circulação de conhecimentos formais e
sistemáticos e os investimentos que o professor faz em sua
capacitação, em seu aprendizado e na sua possibilidade de ensinar
não terão finitude. Assim, também precisa ser entendida a
possibilidade do aluno aprender como sendo infinita, sem deixar de
respeitar a condição de sujeitos na infância, na adolescência ou
na juventude.
A
educação integral entendida como o desenvolvimento pleno, no
sentido de atender à demanda de aprendizagem e ainda ofertando
possibilidades de ampliação do desenvolvimento humano em seus
diversos âmbitos, poderá ser a forma mais propícia para a prática
do desenvolvimento dos objetivos educacionais previstos nas
Diretrizes Curriculares da Educação Básica4.
5. O processo de
aprendizagem do Professor e sua prática na Educação Integral
Ao refletir sobre a
educação integral se impõem questionamentos sobre a formação e
aprendizagem dos professores. Nesse sentido, o relatório presente no
livro “Como as pessoas aprendem: cérebro, mente, experiência e
escola”, organizado pelos psicólogos estadunidenses do Comitê de
Desenvolvimento da Ciência da Aprendizagem, John D. Bransdsford, Ann
L. Brown e Rodney R. Cocking, em 2007, mostra-se um documento capaz
de trazer novas perspectivas sobre esse assunto.
Nesse material, os
autores apresentam na Parte III um estudo sobre o Professor e o
ensino que trazem ricas contribuições a esse campo de pesquisa.
Composto por quatro capítulos, os autores explicitam o projeto dos
ambientes de aprendizagem, exemplos de ensino efetivo, aprendizagem
do professor e o uso das tecnologias de apoio à aprendizagem.
Especialmente no
capítulo 8, que trata da aprendizagem do professor, é possível
observar elementos que, de certa forma, compõem o que poderia
caracterizar um processo de como os professores aprendem a ensinar e
garantir a aprendizagem dos estudantes.
Bransdsford,
Brown e Rodney (2007)
apontam que, de acordo com suas pesquisas, os professores aprendem de
cinco modos peculiares:
1 – Com a própria
prática: adquirem novo conhecimento e nova compreensão de seus
alunos, da escola, do currículo e dos métodos por meio de
experiência prática no exercício da profissão.
2 – Ao interagir
com outros professores: professor mais experiente assessora os
professores novatos no horário de trabalho e também fora da escola,
em associações profisisonais e sindicatos.
3 – Com educadores
de professores: programas de estágios e projetos de aperfeiçoamento
ministrados por consultores.
4 – Em cursos de
pós-graduação: vinculação de melhoria salarial à titulação.
5 – Fora do
ambiente profissional formal: ao terem filhos, em atividades de
treinamento com jovens de sua comunidade.
Com isso, os autores
salientam que o processo de aprendizagem dos professores ocorre em
diferentes lugares e em diversas situações, contribuindo com isso
uma vasta rede de saberes e possibilidades.
Esses
autores indicam também que ao focar a aprendizagem pessoal, é
possível constatar que os professores tendem a estabelecer modos
peculiares de construir esse processo. Por exemplo, citam que muitos
professores, ao buscar o desenvolvimento profissional e pessoal,
criam grupos de interesse em torno de temas e projetos específicos;
organizam partilha de experiências utilizando ferramentas de
aprendizagem on
line
elaborando o próprio conhecimento e criando oportunidades de
aprofundar o conhecimento do conteúdo pedagógico; aprendem a
ensinar vivenciando feedback
e refletindo sobre a própria prática a fim de melhorá-la;
frequentam cursos que auxiliam a perceber aspectos da prática e,
que, ao estabelecerem relação com a comunidade, os professores
estariam desenvolvendo um tipo de aprendizagem que requer colaboração
e participação na pesquisa e prática educacional.
Bransdsford,
Brown e Rodney (2007)
sinalizam, na parte final do capítulo, que, de acordo com a Comissão
Nacional de Ensino dos Estados Unidos, existem problemas naquilo que
chama de Formação pré profissional, equivalente ao que é
comumento chamada no Brasil de formação inicial, como: Tempo
inadequado, Fragmentação, Métodos de ensino desinteressantes e
Currículo superficial.
Com
essa série de observações, esses autores concluem que a
aprendizagem do professor requer um série contínua de esforços
coordenados a partir de conhecimentos da ciência da aprendizagem, o
que representa um desafio importante, não sendo, no entanto, uma
tarefa impossível.
Com esses estudos,
torna-se importante salientar que, em Educação Integral, para
atingir os objetivos de uma formação humana integral, estabelece-se
a necessidade da formação de um novo professor, que, ao
conscientizar-se sobre a própria formação, contribui
substancialmente para a educação dos estudantes.
No
sentido de apresentar uma prática docente coerente com os sentidos e
significados humanizadores trazidos pela concepção de Educação
Integral, torna-se relevante mencionar as importantes contribuições
trazidas pela professora Veronica Branco (2013) no material
“Percursos
da Educação Integral: em busca da qualidade e da equidade”,
publicado pela Fundação Itaú Social. No texto intitulado “Formação
de professores para a Educação Integral”, a professora apresenta
inúmeros questionamentos e uma análise contundente das práticas,
possibilidades e necessidades de formação aos professores que se
colocam a desenvolver seu trabalho em processos de educação
Integral.
Dentre os
apontamentos, Branco (2013) destaca que o foco na concepção
contemporânea de Educação Integral é a aprendizagem, a integração
dos conteúdos curriculares, a expansão do território escolar para
além de seus muros e a admissão de novos atores para participarem
da formação dos alunos.
Na elaboração
desse novo perfil e dessa postura nova em relação ao processo de
ensinar e de aprender, instaura-se a necessidade de uma formação de
professores que priorize verdadeiramente os modos de aprender e
consolidar novos métodos para fazer aprender.
O
que aprendemos com a oferta de cursos de formação continuada dos
professores para este Programa: que cada um destes destaques implica
mudanças na formação e atuação dos professores, porque para
focar a aprendizagem é preciso ter clareza de como se aprende.
Primeiramente,
é preciso demarcar o que as pesquisas e as nossas práticas já
comprovaram: não se aprende por transmissão (aula expositiva),
treino repetitivo (cópia), no isolamento (cada aluno numa das
carteiras enfileiradas), e tampouco em um tempo predefinido (a
hora-aula do professor). Os alunos não são uma massa uniforme. A
sala de aula não é o único lugar de aprendizagem. O professor não
pode, sozinho, entre outras razões, pela limitação de sua
formação, e dos recursos da escola, dar conta de oferecer todas as
oportunidades de aprendizagem que os alunos precisam
(BRANCO, 2013, p. 102).
Essa nova concepção,
de entender e mediar processos de ensino aprendizagem na perspectiva
da Educação Integral, exige salientar que, de acordo ainda com
Branco (2013), “[...] o professor não pode, sozinho, entre outras
razões, pela limitação de sua formação, e dos recursos da
escola, dar conta de oferecer todas as oportunidades de aprendizagem
que os alunos precisam” (p. 103). É um trabalho que se estabelece
no bojo da formação, do estudo, da reflexão, do diálogo e,
sobretudo, da inserção do coletivo da escola nas relações que se
estabelecem entre os conteúdos curriculares e a vida dos estudantes,
considerando os seus contextos de vida e de convivência.
No
texto mencionado, Branco aponta como perfil desejável que o
professor desenvolva sua competência para ensinar com base numa
concepção que o entende como “[...] mediador
no levantamento de interesses dos alunos, na compatibilização dos
conteúdos curriculares, no planejamento, na busca, no questionamento
e na interpretação das informações para que elas se transformem
em conhecimento e em aprendizagem” (p. 103).
Essa nova postura,
esse novo modo de trabalhar do professor, projeta “[...]
o surgimento de uma nova escola, de novos professores e orientadores
da aprendizagem para os alunos do século XXI” (BRANCO, 2013, p.
103).
6. Considerações
Finais
É
inegável as constribuições do educador brasileiro, Anisio
Teixeira, às reflexões e práticas em torno da educação. Mais do
que um pensador, foi um articulador e um cidadão que denunciou com
veemência o atraso e o arcaísmo das escolas como um todo. A partir
dele, pode-se dizer que se estabelece no Brasil uma espécie de
tradição
democratizante, na qual se consolida uma história de enfrentamento
dos interesses reacionários e conservadores contra a efetivação do
direito à educação e a favor de uma pedagogia da esfera pública.
Através de Anisio, também emerge o diálogo entre educadores e
cientistas sociais com o objetivo de instituir a educação como
objeto de investigação e investi-la da dignidade acadêmica, o que
a universidade elitista lhe recusava. Essas lições são
inesquecíveis e, nesse sentido, a obra de Anísio é, para além dos
resultados, um núcleo de reflexão que se abre incessantemente de
forma original.
Assim, apresentar
Anísio Teixeira como nosso contemporâneo é elogiar a sua obra pela
atualidade das questões e a clareza de propósitos e tratamento com
que foram apresentadas e discutidas. É também não aceitar
passivamente o sucateamento dos serviços públicos prestados à
população, dentre os quais a educação se inclui, a desonestidade
de interesses espúrios que desviam verbas públicas e renegam a
justiça social como princípio, a arrogância da universidade quando
seus intelectuais, em nome da competência específica, desvalorizam
a educação como objeto de investigação e conhecimento e abdicam
do exame das suas questões no presente.
Quando
escreveu Educação não é privilégio, livro que tanta polêmica
causou, Anísio chama atenção para a importância do
comprometimento da sociedade e dos poderes públicos com a educação
brasileira. Esse compromisso é, ainda hoje, uma questão de
sobrevivência social, cultural e política. Como ele mostrou, o
preço do reacionarismo e do conservadorismo, cultivados em estreitas
e egoístas reivindicações pessoais, que impedem a visão da
democracia como uma filosofia política e da educação como um campo
de esforços para a sua realização, nunca é inocente.
É
nesse perspectiva, de análise, de crítica, mas sobretudo, de
esperança e altruísmo, que a Educação Integral reaforma suas
bases, pressupondo um conjunto de estratégias para a formação
completa do ser humano, ampliando a concepção da educação
proporcionada pela escola e pela família, abrindo espaço para o
envolvimento e a responsabilidade de toda a sociedade em relação às
novas gerações. Fundamenta-se, portanto, na integração
de tempos, espaços e conteúdos no interior das escolas.
E
para efetivação disso, há que se considerar a necessidade da
prática
de uma nova tendência de formação de professores, uma nova
concepção do docente, considerando-o um profissional competente,
reflexivo
e aberto à colaboração com seus colegas. Essa conceituação, traz
consigo, algumas implicações para o planejamento da formação como
por exemplo, considerar que os docentes não partem do zero para
realizar suas práticas, tampouco para atualizar suas metodologias,
pois possuem uma formação e uma experiência durante a qual
adquiriram crenças, teorias pedagógicas e esquemas de trabalho; e
também, considerar a formação a partir da comparação e do
questionamento da própria prática e em relação a outros colegas.
Isso exige, na formação, um componente de coordenação e
colaboração. E nesse sentido, o documento estadunidense deixou
claro como se processa a aprendizagem do como ensinar por parte do
professor.
Ressalta-se, ainda,
que os professores, via de regra, possuem formação que o condiona a
professar uma epistemologia empirista. Essa concepção
epistemológica impede, muitas vezes, que se avancew pedagogicamente.
Afinal, os avanços pedagógicos implicam mudança no modelo
epistemológico que sustenta as crenças, os valores, as verdades de
cada professor. Para essa mudança, há que se concretizar processos
de reflexão, de diálogo, de estudos, considerando que o empirismo
fundaqmenta-se na relação com o mundo da repetição, da imitação
e da cópia, extremamente denunciadopor Anisio Teixeira.
De
um outro ângulo, uma qualidade antipedagógica da epistemologia
empirista é o autoritarismo, que nela encontra sua fundamentação e
legitimação teórica e prática. Isso, de certa forma, explica o
porquê os professores, em geral, acreditam que seu ensino tem poder
ilimitado para produzir aprendizagens; se esta não ocorre a culpa é
do aluno. O resultado disso é a morte da criatividade. E, evidente
está, que essa postura epistemológica e prática vai contra a
concepção da Educação Integral que entende o estudante em sua
integralidade como pessoa. Faz-se necessário potencializar
um espaços de formação do professor que facilite a apropriação e
o comprometimento destes com a prática da educação integral.
Finalmente,
ressalta-se que as
críticas realizadas ao longo das décadas a respeito dos erros e das
falhas presentes na educação escolar brasileira contribuíram e
muito para trazer novos olhares e novas perspectivas ao cotidiano da
escola. Porém, o que emerge agora é a necessidade de aterrisar na
escola novas práticas e novas perspectivas que considerem o
estudante em suas possibilidades e peculiaridades de aprendizagem. E
não mais simplesmente como um número a ser aprovado ou reprovado. A
vida na escola deve tomar o seu lugar!
7. REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
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M. O aprendizado do ofício. In: ARROYO, M. Ofício
de mestre: imagens e auto-imagens. 13 ed. Petrópolis: Vozes, 2011.
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Z. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2001.
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V. Formação de professores para a educação integral. In:
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Coordenação editorial e textos Beatriz Penteado Lomonaco, Letícia
Araújo Moreira da Silva. São Paulo: CENPEC: Fundação Itaú Social
- Unicef, 2013. p. 101 a 104.
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J. D.; BROWN, A. L.; COCKING, R. R. (Org.). Como as pessoas aprendem:
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Comitê de Desenvolvimento da Ciência da Aprendizagem, Comitê de
Pesquisa da Aprendizagem e da Prática Educacional, Comissão de
Educação e Ciências Sociais e do Comportamento, Conselho Nacional
de Pesquisa dos Estados Unidos. São Paulo: Editora Senac. 2007. p.
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Brasil: direito a outros tempos e espaços educativos. Porto Alegre:
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Documentos de Identidade: uma introdução às teorias do currículo.
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Ciência e arte de educar. In: TEIXEIRA, A. Educação e o mundo
moderno. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2006. p. 67 - 85.
1Professor
Pedagogo da rede estadual de ensino do Paraná. Atua no Colégio
Estadual do Paraná. Mestrando em Educação Pela Universidade
Federal do Paraná. E-mail: supervisoralex@bol.com.br
2Anísio
Spínola Teixeira nasceu em Caetité, sertão da Bahia, em 12 de
julho de 1900, filho de Anna Spínola Teixeira e Deocleciano Pires
Teixeira. Após sólida formação adquirida no Instituto São Luiz
Gonzaga, em Caetité, e no Colégio Antonio Vieira, em Salvador,
ambos colégios católicos jesuítas, bacharelou-se em Direito pela
Faculdade de Direito da Universidade do Rio de Janeiro, em 1922, e
obteve o título de Master of Arts pelo Teachers College da Columbia
University, em 1929. Casou-se, em 1932, com Emília Telles Ferreira,
com quem teve quatro filhos. Faleceu na cidade do Rio de Janeiro, em
1971 (Clarice Nunes, in
Fávero
e Britto 1999, pp. 51-55).
3
O
"Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova", datado de
1932, foi escrito durante o governo de Getúlio Vargas e consolidava a visão de um segmento da elite intelectual que, embora com diferentes posições ideológicas, vislumbrava a possibilidade de interferir na organização da sociedade brasileira do ponto de vista da educação. Redigido por Fernando de Azevedo, dentre 26 intelectuais, entre os quais Roldão Lopes de Barros, Anísio Teixeira, Afrânio Peixoto, Lourenço Filho, Antônio F. Almeida Junior, Roquette Pinto, Delgado de Carvalho, Hermes Lima e Cecília Meireles. Ao ser lançado, no meio do processo de reordenação política resultante da Revolução de 30, o documento tornou-se o marco inaugural do projeto de renovação educacional do país. Além de constatar a desorganização do aparelho escolar, propunha que o Estado organizasse um plano geral de educação e defendia a bandeira de uma escola única, pública, laica, obrigatória e gratuita. O movimento reformador foi alvo da crítica forte e continuada da Igreja Católica, que naquela conjuntura era forte concorrente do Estado na expectativa de educar a população, e tinha sob seu controle a propriedade e a orientação de parcela expressiva das escolas da rede privada.
Disponível
em:<http://pt.wikipedia.org/wiki/Manifesto_dos_Pioneiros_da_Educação_Nova>.
Acesso em 01/12/2014.
4
Documento de caráter teórico e metodológico que fundamenta e
orienta o ensino das disciplinas de tradição curricular da
Educação Básica. São frutos de discussão coletiva realizada
durante seis anos (2004-2009) que envolveu todos os professores da
rede estadual de ensino.
Disponível em:
<http://www.cidadao.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=193>.
Acesso em 01/12/2014.
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