Alexandro Muhlstedt
Há anos as escolas do
Paraná contam, em seu quadro de pessoal, com o pedagogo como
profissional, especialista de educação. No entanto, essa presença
não tem conseguido interferir significativamente na qualidade dos
serviços que a escola vem prestando à sociedade. Apesar da forte
presença no cotidiano da escola, assistimos a uma verdadeira
inversão de papéis.
A ação do pedagogo
junto aos professores tem se revelado insuficiente, inadequada, pouco
expressiva porque este profissional acaba se envolvendo (por força
das circunstâncias e da necessidade) num verdadeiro turbilhão de
tarefas. Tarefas que, na maioria dos casos, nem precisa ser pedagogo
para resolver. Dito isso, a ação do pedagogo no momento da hora
atividade do professor, bem como o atendimento (discussão, estudos,
reflexão) acabam não ocorrendo satisfatoriamente porque o pedagogo
se vê imerso em dezenas de atividades que compromete drasticamente o
acompanhamento do ensino e da aprendizagem.
Notemos, por exemplo, um
dia “normal” em nossas escolas da rede estadual: cuidar da
entrada dos alunos, recreio, saída; organizar as filas de entrada
dos alunos; atender os pais na escola; ligar para os pais dos alunos
doentes, faltosos, com dificuldade de aprendizagem; substituir
professores faltosos; informar os pais de trabalhos não feitos pelos
seus filhos; registrar o comportamento de alunos indisciplinados;
conversar com alunos indisciplinados por falta de autoridade do
professor; encaminhar o Projeto Político Pedagógico, Proposta
Pedagógica Curricular, Regimento Escolar, etc; verificar Plano de
Trabalho Docente; organizar trabalhos de Plano Especial de Estudos;
acompanhar dependência e adaptação curricular; passar remédio
quando caem os alunos; atender alunos na hora do lanche; promover
Conselho de Classe; organizar a agenda de passeios; fazer mapeamento
de aprendizagem; acalmar professores exaltados; não permitir que
mães batam em seus filhos dentro do colégio; orientar aluno
nervoso; conversar sobre princípios éticos dos alunos; atender
aluno que se sentiu ofendido pelo professor; verificar atividades dos
alunos de SAREH (Serviço de Atendimento à Rede Hospitalar);
explicar aos professores sobre a FICA (Ficha de Aluno Ausente);
preencher documentos, fichas, relatórios, questionários, pesquisas;
atender estagiários; participar de reuniões de conselho escolar,
APMF(Associação de Pais, Mestres e Funcionários); corrigir
calendário escolar; entre outras atividades.
Diante disso nos
questionamos: Quando, finalmente, poderemos sentar, estudar, refletir
e construir novos rumos para o ensino aprendizagem junto ao
professor?
Na hora atividade, muitas vezes o professor está lá, de olho, aguardando, ansioso, o momento em que o pedagogo se desvencilha dos atendimentos apaga incêndio, para vir perguntar algo sobre como melhorar sua prática a fim de possibilitar que determinado aluno consiga aprender... Muitas vezes, se torna desgastante demais não visualizar seu trabalho de forma mais concreta, mais pedagógica.
Na hora atividade, muitas vezes o professor está lá, de olho, aguardando, ansioso, o momento em que o pedagogo se desvencilha dos atendimentos apaga incêndio, para vir perguntar algo sobre como melhorar sua prática a fim de possibilitar que determinado aluno consiga aprender... Muitas vezes, se torna desgastante demais não visualizar seu trabalho de forma mais concreta, mais pedagógica.
Sabemos que o pedagogo
atuante favorece a formação em serviço, a reflexão e o estudo,
fortalece a interação humana na escola, organiza o cotidiano,
estimulando o respeito mútuo e a boa convivência.
Para bem atuar no
enfrentamento de suas funções no cotidiano da escola, é necessário
saber com muita clareza o que é essencial, o que é importante e o
que é acidental. Mas não basta só saber. É preciso querer e
priorizar fazer só o que é necessário a cada momento. O pedagogo
realmente competente só tem tempo para o que é essencial em seu
campo de atuação. Ele deve procurar executar a essencialidade com
muito esmero, dando atenção aos detalhes, garantindo o sucesso em
tudo na primeira investida, evitando o desperdício de esforços e de
tempo, agindo como estimulador cultural, criando condições
necessárias à conquista de melhores resultados, vencendo, uma a
uma, as amarras do tradicional em seu trabalho, sem medo de errar,
evitando ser um tarefeiro, pau para toda obra ou fiscal do desempenho
do professor.
Consideramos importante a
ideia de definir com o grupo de professores a essencialidade da
própria ação, identificando onde a presença do pedagogo se faz
necessária. Por exemplo, onde a atuação docente apresenta
resultado insatisfatório ou fraco: junto aos professores novatos,
com dificuldades para conduzir o trabalho de classe. É essencial
trabalhar com dignidade e ânimo para vencer as eventuais
resistências, com competência e humildade; atuar com boa vontade,
promovendo mudanças de forma fácil e cooperativamente, como
co-partícipe do sucesso profissional de todos. Onde há uma vontade,
há um caminho. Mas, onde existe boa vontade, existem vários
caminhos. E é nessa direção que devem ser trilhados o caminho de
uma ação pedagógica que, considerando o contexto da instituição,
também envolve o conjunto de condições oferecidos e existentes nas
rotinas da escola.
Essas condições não
são oferecidas de modo gratuito, pela bondade de governantes ou
compaixão de diretores. Elas são construídas e exigidas de modo
coletivo, é fruto de lutas e expressão de trabalho ético e
comprometido. Quando não são ideais, necessitam de profissionais
reais para concretizar ação coerente, fugindo dos processos que
engolem a rotina em situações corriqueiras. Há, então,
necessidade da fuga do “papel de bombeiro” para postura e
posicionamento ético, digno, coerente com princípios da organização
verdadeira do trabalho pedagógico.
Dessa forma, o pedagogo
deixa de ser um apagador de incêndios e passa a trabalhar no sentido
de conseguir alcançar, pelo menos, três metas:
META
1
Evidenciar
o bom desempenho docente em suas funções básicas, incentivando o
professor a buscar o próprio crescimento junto aos colegas. Ninguém
cresce sozinho. Todos temos algo a contribuir para o crescimento
alheio, um pouquinho que seja. É a qualificação em serviço,
tendo em vista ações possíveis e viáveis, ousando e realmente se
envolvendo pela busca da melhoria no desempenho.
META
2
Valorizar
o professor como profissional, reconhecendo-lhe todo e qualquer bom
desempenho evidenciado; e como pessoa, ouvindo-o com respeito e
empatia, criando espaço para que participe efetivamente do processo
educativo. Criando o espaço de troca e de diálogo, em que todos
possam ser sujeitos de ação e agentes de mudança.
META
3
Implementar
o currículo proposto no projeto político-pedagógico da escola,
acompanhando o processo de ensinar, avaliando a ação pedagógica e
procurando viabilizar a boa e saudável interação humana no
interior da escola: professor–professor, professor–aluno,
professor–pedagogo; e também fora dela: professor–escola,
escola–comunidade. O pedagogo deve, ainda, esforçar-se para
adquirir uma boa cultura geral, a fim de ser capaz de transformar
princípios em ação.
Nesse sentido, para o
pedagogo, enquanto intelectual comprometido com a transformação
social, pensar a escola concreta é ponto estratégico, pois a partir
daí, inicia-se um novo movimento: o de buscar compreender o meio em
que ela está inserida, seus desafios, seus anseios, suas
contradições e seus limites. É preciso analisar o mundo do aluno
para, a partir do conhecimento de sua realidade, ajudá-lo a
encontrar meios para mudar a correlação de forças com a sociedade
que o explora. E a partir daí, procurar desenvolver a sua capacidade
de organizar o pensamento e compartilhar suas ideias, de se
constituir enquanto grupo, de compreender a força da ação
coletiva, de liderar, de pensar criticamente a realidade social, de
filtrar da história oficial a história de sua classe, de se
capacitar a se tornar sujeito de sua própria história. (VALE, 1982,
p. 35).
Para tanto, cabe ao
Pedagogo viabilizar articulações no processo ensino aprendizagem
promovendo abertura no interior da escola para que professores,
alunos e pais de alunos, como um todo, possam estudar, discutir e
avaliar a qualidade dos conteúdos trabalhados, bem como o material
didático, procedimentos de ensino, avaliação e programas, ou seja,
tudo o que faz parte do trabalho pedagógico na sua totalidade.
Assim, o pedagogo estará comprometido com a construção de uma
sociedade democrática, visando à superação do trabalho
fragmentado dentro da estrutura educacional. Certamente, é grande o
desafio do Pedagogo em efetivar seu trabalho no âmbito da ação
coletiva.
Porém, além de ser uma
questão de compromisso pessoal, é também uma questão de formação,
daí a necessidade de instituições de ensino superior que estejam
dispostas a formar profissionais capacitados para estarem rompendo
com as teorias tecnicistas, reformulando a ação tecnicista,
fragmentada do trabalho escolar, e buscando o trabalho coletivo na
execução das diversas funções dentro da Escola. E,
principalmente, enfatizando sempre que o projeto maior de todo
pedagogo, independentemente da sua área de atuação, é o processo
de produção do conhecimento.
E, finalmente, para que
se realize, no “chão de fábrica” e no cotidiano de nossas
escolas, necessitamos garantir que a hora atividade do professor seja
hora de produção, de reflexão, de estudos, de embate de ideias,
etc mediados pela ação do pedagogo. Pedagogo enquanto profissional
do conhecimento, e não de tarefas e ações que não exigem formação
em Pedagogia, como algumas citadas nesse texto.
Necessitamos, então,
formalizar nossa prática pedagógica, conectada às necessidades da
escola e, sobretudo, às necessárias transformações no fazer do
Pedagogo.
5.
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