quinta-feira, 19 de novembro de 2009

RECONSTRUÇÃO COLETIVA DO PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO: Reflexão, possibilidades, avanços e esperança

Alexandro Muhlstedt
E, se o futuro é já presente
Na visão de quem sabe ver,
Convoca aqui eternamente
Os que hão de ser!
(Fernando Pessoa. O eu profundo e os outros eus, 2006)


A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) nº 9394/96, em seu artigo 12, inciso I, prevê que “os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, tem a incumbência de elaborar e executar sua proposta pedagógica”, deixando explícita a ideia de que a escola não pode prescindir da reflexão sobre a intencionalidade educativa.
Por isso, em março de 2009 iniciamos o trabalho de reconstrução do Projeto Político Pedagógico - PPP - do Colégio Estadual Professor Francisco Zardo, de Curitiba. Foi constatado que a versão do PPP que existia era confusa, contraditória, repleta de correções feitas pela coordenação do Setor Santa Felicidade e não coincidia com a realidade e o retrato do Colégio. O documente existente claramente mostrava que fora feito para cumprir os prazos e não retratava verdadeiramente a "cara" da escola. Tendo em vista esta problemática, reescrever o PPP, almejando as mudanças necessárias e desejadas pela diretora Naterci de Souza, era uma urgência.
Diante desse panorama, organizamos, Direção e Equipe Pedagógica, um cronograma para reconstruir o PPP, seguindo, basicamente, dois princípios: a PARTICIPAÇÃO de todos: pais, alunos, funcionários, direção, pedagogos e professores - e a busca por um RETRATO fiel da realidade, dos anseios, dos sonhos e das práticas do Colégio. Para isso, a revisão bibliográfica (por meio das obras de Danilo Gandin, Ilma Passos e Celso Vasconcelos) e o processo metodológico (Qualitativo, Participativo e Gradual) foram definidos. Também foram articuladas as comissões de Alunos e Pais, de cada turno do colégio e, incluídos, todos os professores e funcionários em outras duas comissões. Esse tipo de planos tornou-se necessário tendo em vista o envolvimento de todos os âmbitos para pensar, refletir, adequar e buscar as transformações e modo coletivo e engajado. Definiu-se também, como forma de preservar a memória do processo e organizar a sequência das atividades, que todas as ações seriam registradas em livro ata específico, bem como a catalogação de fotos e relatos escritos dos participantes.
O primeiro passo foi construir a Árvore dos Problemas e a Árvore das Soluções, por meio da técnica Tempestade de Ideias. A técnica da Árvore é uma adaptação na qual são colocados em painel na parede todas as solicitações sugeridas para a problemática ou tema geral. Nos meses de março e abril todas as Comissões realizaram tal atividade. Envolver os professores não foi tarefa fácil, tendo em vista que em outros momentos a participação em construção do PPP não foi muito positiva. Havia uma certa descrença e resistência em realizar tais atividades.
Mesmo assim, num sábado à tarde foi apresentada aos professores a teoria que embasa a construção coletiva do PPP, por meio de cartazes e palestra do pedagogo Alexandro Muhlstetd, na qual apresentou a organização das partes do PPP: Marco Referencial, Diagnóstico e Programação (que serão descritos no texto seguinte). Esclarecimento de dúvidas, debate, questionamentos e trabalho em grupo foram ações concretizadas nesse dia. Foi possível perceber que uma mudança no próprio grupo de processava, em especial, numa nova credibilidade à construção e ao próprio documento PPP.
Após a construção de 16 árvores, solicitou-se a cada comissão, em diferentes momentos, a elaboração de duas tarefas: descrever ações do cotidiano que retratam os problemas apontados e as sugestões de ações para superar, minimizar ou eliminar tais problemas. Para cada solução apresentada cada comissão foi provocado a escrever uma definição ou conceito e, depois, ações que poderiam ser vistas no cotidiano da escola que demonstrassem que o problema estava sendo percebido e sua solução sendo implementada. Para isso, utilizou-se cada momento, incluindo encontros aos sábados com os professores e algumas noites com pais e alunos, para escrever e dar forma a tudo que foi apresentando pelas comissões ao construírem as árvores. Foram momentos preciosos de discussão e sistematização de como implementar os planos de melhoria, considerando as condições e as possibilidades existentes. Em muito momentos se ousou, e muitos planos foram audaciosos. E sempre fortalecendo a crença que tudo na escola poderia ser melhor.
De posse de todo esse material, registrado em forma de tabelas, esquemas, textos e fotografias, a equipe pedagógica “costurou” as informações, buscando referenciais teóricos para fundamentar a produção já realizada. Para a elaboração do Marco Referencial, optou-se por trabalho em grupo de professores para responderem questões sobre: mundo, sociedade, homem, educação, escola, comunidade, processos pedagógicos, etc. No Diagnóstico, organizou-se pesquisa sobre números, estatísticas e realidade do Colégio. Professores e pedagogos escreveram o perfil do aluno, do professor, da comunidade, das ações pedagógicas, das festas, dos programas e projetos existentes na escola. Alunos opinaram e descreveram seu ponto de vista sobre a escola e pais deram palpites e ideias sobre escola, educação e como participar mais. Na Programação, foram elencadas todas as ações do cotidiano, as regras gerais, as políticas, as estratégias, as rotinas e as linhas de ação para melhoria do Colégio. Por fim, o material foi todo organizado, gerando o documento mais importante no Colégio Francisco Zardo: o PPP. Documento construído coletivamente, retratando o que temos, o que somos e o que queremos para uma escola de qualidade.
No final do mês de agosto de 2009 uma versão do PPP foi entregue ao Setor. A coordenadora pedagógica, Viviane Langer acompanhou, de certa forma, a construção desse PPP e ficou entusiasmada por ver o resultado do trabalho. Por isso, fez um convite interessante: apresentar a trajetória da construção às equipes pedagógicas das 22 escolas do setor Santa Felicidade, o que aconteceu no dia 22 de setembro de 2009. Foi uma experiência bastante interessante, visto que outras escolas puderam perceber que é possível fazer um PPP em que todos os setores da escola participam, e, mais que isso, engajar a todos em prol da solução dos problemas apresentados pela instituição.
Construir um PPP coletivamente dá muito trabalho, desgasta e cansa. No entanto, é só dessa forma que se torna possível construir, na escola, uma linha única de trabalho, respeitando a diversidade e propiciando a participação, a integração e a organização do trabalho pedagógico. Falar uma língua comum não é homogeneizar ou engessar, mas fortalecer ações pedagógicas tendo em vista a superação dos limites e adversidades. E, claro, trabalhar no coletivo, pelo coletivo, é muito mais saudável em tempos de egoísmos extremos. E, alimentar a esperança por uma escola pública melhor nunca é trabalho em vão.


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